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sábado, 28 de março de 2020

POR SEBASTIÃO DIÓGENES: FIQUE EM CASA!

Dr. Sebastião Diógenes - Membro da Sobrames-CE

Fique  em casa!
         A natureza humana sempre teve para os seus ferimentos os remédios apropriados.” (Santo Agostinho)

         Estamos sob a tirania do coronavírus.  Trata-se de um insaciável aniquilador de vidas humanas, e, ao mesmo tempo, um detonador do sistema produtivo das nações. Uma das ordens das autoridades sanitárias para combater o voraz inimigo é ficar em casa. Não sair de casa! Há gentes que têm dificuldades de obedecer às recomendações básicas de prevenção da pandemia, por razões diversas, que não cabem, neste espaço, o mérito da argumentação.
       Participei de um vídeo realizado pela Sociedade Cearense de Otorrinolaringologia, estimulando as pessoas que ficassem em casa. “Fique em casa!” é o slogan da campanha.  O vídeo correu o mundo. E a filha do compadre Raimundo Carlos assistiu a ele, e me ligou apavorada.
O pai tem 80 anos, e um passado de câncer do aparelho digestivo. Além da cirurgia, ele submeteu-se a radio e quimioterapia. Embora seja considerado curado da neoplasia, a filha julga ser o pai uma pessoa, ainda mais, vulnerável à patogenicidade do Covid-19.
         - Padrinho, papai não está fazendo a quarentena. Sai para a rua, vai ao sítio, como se nada de grave estivesse acontecendo. Ele está causando o maior problema aqui em casa. Mostrei o seu vídeo a ele. O senhor poderia ligar pra ele e dar uns conselhos?
         Liguei para o compadre. Com bons modos, e de forma didática, expliquei sobre a epidemia. Argumentei que a situação é muito grave, e que o isolamento em casa é a melhor forma de prevenir a doença, que é fatal em milhares de casos entre os idosos.  
         - Pois não, meu compadre Tião! Fique tranquilo! Vou seguir o seu conselho – prometeu, e se queixou do pessoal dele, afirmando que era muito exagerado nas coisas.
         Dois dias depois, Sirlene, a afilhada, telefonou alegando que o pai continuava desobedecendo às regras de prevenção contra o Covid-19. Voltei a entrar em contato com ele pelo celular.
         - Bom dia, compadre Raimundo! Onde você está? – perguntei como quem faz uma ronda para verificar o cumprimento de uma regra estabelecida.
         - Estou em casa! – respondeu sem convicção, logo depois de eu ter escutado o mugido da vaca.
         - E você está com a vaca no apartamento, compadre Raimundo? – repliquei com ironia.
         Pediu desculpas pela mentira. Realmente encontrava-se no sítio, não havia como negar. Recorrendo mais uma vez aos bons modos de falar, trouxe-lhe à lembrança as quatro cirurgias que se submetera no passado. E lhe avivei a memória, alegando a minha presença nos socorros urgentes.  Adverti-o, que em caso de contrair o novo coronavírus, não lhe poderei prestar nenhuma assistência, como o fizera nas enfermidades pregressas.
         - Eu compreendo o meu compadre! Agora estou vendo que a coisa é muito séria – respondeu dizendo que desta vez eu podia ficar tranquilo.
         Dois dias depois, recebi novo telefonema da afilhada. O comportamento do pai em nada mudara. Sem demora, peguei o telefone e queimei a última tentativa.
         - Fala Dr. Sebastião Diógenes!... – já me atendeu diferente, com formalidades.
         Senti que o velho Raimundo Carlos não estava para conversa. Procurei ser sucinto. Conheço a figura!
         - Estou telefonando para comunicar que, caso a indesejada o visitasse, não lhe poderei comparecer ao enterro. E dei por encerrada a tarefa de tentar salvar a vida de um cabeça-dura.
         Três dias depois, Sirlene me ligou feliz da vida. Perguntou o que eu fizera para obrar o milagre. O pai havia três dias que não saia de casa.
         - Acho que desta vez empreguei argumentos mais persuasivos – respondi triunfante, com a tática empregada para causar o milagre.
Sebastião Diógenes.
28-03-2020
               

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