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quinta-feira, 26 de março de 2015

POR: PEDRO NOVAES - INTERVENÇÃO MILITAR

      
Dr. Pedro Novaes - engenheiro agrônomo e advogado

 INTERVENÇÃO  MILITAR

                                                                       Pedro Israel Novaes de Almeida

            Não são poucos os brasileiros que clamam por uma intervenção militar, e também não são poucos os que abominam tal ideia.
            No imaginário de grande parte da população, o período sob mando militar seria caracterizado pela ordem, sem distúrbios sociais, e com valorização dos valores básicos da sociedade.
            O velho sonho de ver sumariamente varridos da vida pública corruptos e outros que alugam mandatos, anima e dá esperança a multidões de brasileiros.
            A intervenção militar pode ser iniciada pela simples deposição de autoridades, com uso da força ou simplesmente seu aceno. Tomar o poder não é difícil, ao mais forte ou melhor armado.
            O problema começa nas medidas iniciais dos revoltosos. A romântica ideia de prender bandidos, julgá-los e sentencia-los sumariamente, tornando-os inelegíveis, exige a edição de textos legais que quebram todo o ordenamento jurídico, iniciando um período de exceção, onde sempre figuram como vítimas as garantias constitucionais da cidadania.
            No imaginário popular, bastaria depor, prender, convocar eleições e retornar ao quartel. Santa inocência !
            Militares possuem aguçado senso de obediência e hierarquia, além de formação cultural valorizadora da noção de pátria, costumes e tradições, ingredientes raros na atividade política. As cúpulas são compostas por estrategistas natos, com profundos conhecimentos de geopolítica.
            Na definição dos cargos e providências, e principalmente no dia-a-dia da administração, surgem questões de conveniência e convivência políticas, que não encontram orientações nos manuais da caserna. Como seres humanos que são, os militares também estão sujeitos a caprichos e sonhos de poder e prestígio pessoal, iniciando o grande dilema do tempo necessário à devolução segura do poder aos civis.
            Não sendo super-homens, também estão sujeitos aos atrativos do poder, inclusive práticas corruptas e clientelistas, tão maiores quanto maior a permanência no poder. As características da obediência e hierarquia tendem a dificultar o respeito e a aceitação de argumentos e manifestações contrárias, gerando clima indutor de censuras.
            Os militares tendem a defender tradições e culturas, assumindo as cores do poder pátrio. No Brasil, são verdes, em Cuba vermelhos.
            Os militares são moldados e treinados para o cumprimento de rotinas e missões constitucionais, não para gerir toda uma nação. Podem, e devem intervir, legal e legitimamente, em casos de quebra da ordem constitucional ou grave comoção.
            A intervenção militar, tal qual clamada por alguns setores da sociedade, é na verdade um golpe de Estado, e, aplaudida ou não, o início de um regime de exceção, popular ditadura.
            Militares brasileiros ainda amargam as memórias do período em que ocuparam os poderes da república. Os aliados civis da época foram, aos poucos, sendo esquecidos.
            Existe, por aí, a estranha versão de que nenhum brasileiro comportado teve problemas com as autoridades, à época. São, contudo, inúmeras as versões de brasileiros que acabaram torturados e mortos, pelo simples fato da discordância, ainda que pacífica.
            Definitivamente, a intervenção militar não é a solução que queremos.
                                                                              pedroinovaes@uol.com.br

                

CONVITE - JUBILEU DE OURO SOBRAMES


POR: ANTERO COELHO NETO - A SAÚDE PÚBLICA DO BRASIL

Dr. Antero Coelho Neto - Médico e Membro da Sobrames-CE

A SAÚDE PÚBLICA DO BRASIL

Para uma boa Qualidade de Vida, é necessário desenvolver os seus dois princípios fundamentais: Educação e Saúde.  
Por feliz coincidência e felicidade, durante toda a minha vida, tenho dirigido o meu aprendizado e trabalho nessas duas áreas. Como explicação de  minha atuação, tenho de agradecer aos amigos, que sempre e intensamente, me ajudaram e estimularam para isso . Na saúde, principalmente, para os aspectos difíceis da Saúde Pública. Fui convidado para ser Superintendente do INAMPS (Instituto Nacional da Assistência Médica da Previdência Social do Ceará) para sua atualização adequada; para a Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília, na formação de seu curso de Medicina, planejado em Blocos de Sistemas e atuação no desenvolvimento do Hospital de Sobradinho; no planejamento e funcionamento (Reitor) da Universidade de Fortaleza por 8 anos, e de várias faculdades e organizações de saúde no Brasil; para a Organização Mundial da Saúde, como Representante (Diretor) na Colômbia e na Venezuela, durante 10 anos, trabalhando, principalmente em saúde pública desses países e outros, quando solicitado. 
Aprendi e passei a ser um defensor dos dois elementos fundamentais para a saúde pública do país: administração planejada, eficiente e continuada com adequação dos níveis de saúde para a população, o que não encontramos na saúde pública da grande maioria dos municípios brasileiros.
Destaco que o programa SUS (Sistema Único de Saúde) brasileiro, constitui um dos mais adequados, teoricamente, quando comparado com o de vários outros países, principalmente da América do Sul. Classifica os hospitais e serviços da rede pública, quanto aos níveis de atenção em saúde primária, secundária e terciária que associados aos de nível quaternário, de Universidades e de  Instituições Especiais, ofereceria o que necessita a saúde pública do Brasil. Infelizmente assim não acontece com a falta de recursos humanos, financeiros e técnicos, e os problemas decorrentes são, cada vez, mais graves.  Todos os dias os órgãos de comunicação estão cheios de notícias da má saúde pública brasileira.
Também lembro que a falta de continuidade dos projetos e programas de saúde da população brasileira, com a constante mudança política e a indefinição dos responsáveis pelos mesmos, é um fato comprovado e lamentável, desde há muitos anos. Recordo de um conhecido e importante dirigente, quando me convidou e disse que no meu projeto deveria “esquecer tudo aquilo que tinha sido feito antes”. Claro que tive de realizar o projeto sem dizê-lo que várias das indicações anteriores eram úteis e estavam sendo repetidas. Sabia que ele não teria tempo de ler a minha proposta que foi aceita e utilizada, mas também não usada pelo político seguinte.    
E, muito mais ainda, entristece-me a não formação com humanização da medicina, de nossos graduados pelas faculdades e universidades brasileiras.
Alegra-me, neste momento tão importante da vida brasileira, saber que o Governador de nosso Estado, convidou um profissional de alta competência,  como o Dr. Carlile Lavor, para Secretário de Saúde. Trabalhamos e aprendemos juntos e, tenho certeza, ele sabe o que deve ser feito. Que lhe sejam dados os elementos necessários para a implantação de uma indicada saúde pública
Sem dinheiro e sem profissionais capacitados e adequados para a saúde pública brasileira, jamais vamos alcançar uma boa qualidade de vida.   
E até quando isso vai acontecer no nosso Brasil?                                                                                                             

Antero Coelho Neto
Médico e Professor


POR: ISAAC FURTADO - SIMPLESMENTE MULHER

Dr. Isaac Furtado - Médico e Membro da Sobrames-CE


Simplesmente mulher

"Mulher é razão e emoção lado a lado...
O princípio e o fim inacabado.
Mulher é musa e inspiração...
Curva perigosa e doce angulação...
O rio na ânsia do mar,
na busca de um porto seguro.
Mulher especial é redundância.
Nem bem e nem mal,
SIMPLESMENTE MULHER."

O que seria da vida?

O que seria da vida se não fosse o disparate
de nada saber segundos depois.
Sem saber quem chega ou quem parte.
Sem entender para que serve a arte.
O próximo verso em desatino.
O traço a mais no papel.
O trago a mais no final da noite. As lembranças de menino.
O amor que segue blindado de jeans e rock-and-roll.
O que seria da vida se não fosse a sorte.
A louca vontade de viver mais.
De acordar tarde e dormir sem perceber.
De madrugar ao alvorecer.
O que seria da vida se não fosse você

sábado, 14 de março de 2015

POR: SEBASTIÃO DIÓGENES - QUANDO O FACÍNORA CHOROU




 
Dr. Sebastião Diógenes - Médico e Tesoureiro da Sobrames-CE
Quando o facínora chorou

    No vale do rio das Onças nasceu e se criou Iralfonso, que viria a ser um famigerado facínora. Nesse lugar perigoso, onde os homens praticavam atrocidades com reputação de valentia, não escapou a Iralfonso a medieval cultura dos seus ancestrais. Cometeu o primeiro delito de sangue aos dezesseis anos de idade. A vítima foi o bem-querido gato da casa da namorada. Com o mesquinho propósito de mostrar as armas que ganhara do pai, descarregou o revólver no pobre animal, e, em seguida, sangrou-o com o punhal de cabo multicolorido. Uma selvageria sem medidas, tudo o fez com a crueldade dos facínoras. A atitude inesperada e violenta do jovem causou pânico naquela pacata família. Sensatos e cautelosos, os pais da mocinha solicitaram ao delinquente que se lhe retirasse do lar. Tiveram a fortuna de ser atendidos. Foi a última vez que o viram, porque a família, apavorada, logo mudou-se para a Capital.
            O assassínio do doméstico animal da Felidae família foi, para as gentes do vale, o augúrio do nascimento de um novo pistoleiro na região. Não demorou a confirmação do mau presságio. O primeiro crime contra a vida de uma pessoa aconteceu em uma vaquejada, que valia prêmios. O boi, que Iralfonso puxara pelo rabo, caiu com as patas fora da faixa regulamentar, o juiz não lhe atribuiu o ponto, e o locutor gritou para o público: “Não valeu o boi”. Transtornado com a desclassificação na competição, o assassino travestido de vaqueiro dirigiu-se ao palanque do juiz, e matou-o com seis tiros de revólver. Seguindo uma continuada prática na região, Iralfonso refugiou-se por ali mesmo, que para serviço de morte não faltaria o amparo de homiziadouros e bacharéis do ramo.
            Iralfonso contava um ativo de mais de duas dezenas de mortes, das quais seis em uma chacina, quando foi preso pela terceira vez. Os mandantes não se preocupavam com a sua detenção, ele tinha a fama de não abrir a boca, não nomeava a autoria intelectual do homicídio, nem sob tortura. O sigilo era-lhe a marca registrada do impiedoso ofício. Tornou-se o executante de confiança, o preferido.
            O celerado foi preso várias vezes, logo ganhava a liberdade pelas brechas da lei, que a justiça sempre encontrava. Todavia, foi julgado e condenado à pena máxima por um dos crimes de maior repercussão. Tinha, porém, privilégios no cárcere: cela especial com geladeira, micro-ondas, televisão, cama e banheiro. Recebia com regularidade visita íntima da mulher, casados havia cinco anos, por quem mantinha uma atormentada paixão. Jovem e livre de inibições, a sedutora esposa despertava a concupiscência por onde passava. Preocupações e ciúmes passaram a atormentar o espírito de Iralfonso. Ainda não tinham filhos, lamentava consigo mesmo, a maternidade poderia ser um freio às glândulas da mulher.
            Cumpria o quinto ano de reclusão, um sexto da pena, quando Iralfonso recebeu a notificação da liberdade condicional por bom comportamento. Ele não acreditava nessa história de bom comportamento na prisão. Sabia que, por trás dessa liberdade, havia gente de poder necessitando dos seus funestos obséquios, e aguardava com ansiedade a visita do agenciador. 
            Apesar de sempre ter desejado a liberdade, até tentativas de fuga havia planejado,  Iralfonso não esboçava a ínfima alegria com a notícia que logo deixaria a prisão. Estava muito amargurado com as ausências da mulher. As visitas rareavam, havia um ano, e contava três meses que não comparecia à casa de detenção, nem dava notícias. O ciúme era o único tormento que lhe afligia a alma, sentia-o de forma intolerável e incontrolável. Encontrava-se absorto nessas reflexões, e tomado de uma tristeza profunda, quando o agente carcerário lhe anunciou, com intimidade:
            - Visita pra você, seu Ira!
            Não indagou de quem se tratava, esperava que fosse a mulher. Claro, só poderia ser ela, embora estivesse sumida por todos esses meses. Talvez existisse uma justificativa convincente para tanto desprezo, uma doença grave, por exemplo, ou quem sabe, razões outras alheias à sua vontade, imaginava Iralfonso, que somente agora a pobre mulher pôde se apresentar para as honras do matrimônio. Ora, ora, só poderia ser isso mesmo, mulher de cabra-macho não faz besteira, conjeturava, e a ideia de fidelidade conjugal se lhe esboçava na mente, quando lhe despertou uma voz grave:
            - Com licença seu Iralfonso – e foi entrando na cela especial o agente de negócios do matador por encomenda. – Tenho um servicinho pra você fazer. É gente de poder e muito dinheiro. O futuro finado também é gente graúda. Por isso você vai deixar a cadeia, porque o serviço exige qualidade e muito segredo.
            - Pra quando é o serviço? – perguntou Iralfonso, com visível apatia.
            - É pra já, é tarefa de certa urgência, deve ser executada logo que você saia daqui.
            Iralfonso ficou calado, pensativo, com a fisionomia de quem estava com profundo sofrimento da alma, parecia um ser arrependido dos bárbaros crimes. O agenciador logo percebeu o estado de desânimo e tristeza do matador, e inquietou-se:
            - Qual é a sua, cara, tá roendo a corda?
            - Estou com coisas na cabeça – respondeu-lhe o matador. – Desconfio que a minha mulher anda me traindo. Você sabe de alguma coisa?
            O agente da associação criminosa procurou desconversar, que não sabia de nada, não tinha o costume de dar ouvidos às fofocas.
            - A verdade ou não faço o serviço! – sentenciou Iralfonso.
            - É verdade, sim! – respondeu secamente o agente. - Inclusive ela está grávida, vive amancebada com o seu primo, o Wilgerson. O pior da história é que a desmiolada não sabe sequer quem é o autor da barriga.
            Iralfonso ficou paralisado, pensativo, e com o olhar perdido no chão que lhe acolhia as pontas dos cigarros, fumados com desespero.  Após um longo pensar, levantou a cabeça, fungou o nariz encharcado, e surpreendeu o agenciador com a inesperada decisão.
            - Acho que vou largar essa mulher!...
            Iralfonso saiu da prisão, cumpriu o último serviço de encomenda e nunca mais se teve notícias dele. Alguns diziam que foi vítima de queima de arquivo, outros afirmavam que a vergonha insuportável lhe modificou o caráter, virou pastor evangélico em longínquas terras da Amazônia. Poucos meses depois, a mulher por ele repudiada, porém, cuidada com regalo pelo primo Wilgerson, e livre de necessidade, pariu um supermenino com três baguinhos. Causou grande alvoroço na redondeza a novidade congênita que se mostrava entre as perninhas do infante.  As mulheres arrazoavam entre si: algumas diziam que o menino era a cara do Iralfonso; outras, achavam-no uma gracinha, “Tá na cara que é do primo dele, é o danado do Wilgerson na pintura!”, exclamavam com convicção. Neste entretanto, dezessete mulheres que tiveram vinte e sete filhos com o primo Wilgerson, juravam pelo conteúdo dos sacos, às gargalhadas, a quem o menino puxara.
Sebastião Diógenes.
14-02-2015.




terça-feira, 10 de março de 2015

REUNIÃO DA SOBRAMES-CE 09/03/2015

Sentados da E. pra D. - Flávio Leitão, Ana Margarida, Celina Côrte, Nilza Saraiva e Francisco Saraiva 
Atrás da E. pra D. - Isaac Furtado, Francisco Pessoa, Sebastião Diógenes e Vicente Alencar 





 

Ontem, dia 9 de março de 2015, aconteceu mais uma reunião da Sobrames-CE. A mesma  foi presidida pela Dra. Celina Côrte e seguiu a pauta abaixo.

 
PAUTA DA REUNIÃO ORDINÁRIA - 09/03/2015


1 - Abertura da sessão

2 - Discussões da ata enviada por e-mail (anexo)

3 - Faltas justificadas

Djacir Figueiredo - em viagem

Thomas Ribeiro Ramos - motivos pessoais

Marcelo Gurgel – em viagem

 

4 - Comunicações

 Recebimento de livros:

 - Dr. Simão Arão Pecher – Ecolemas

 - Dr. Winston Graça – dois  - Um Saco de gatos e Haikais

 - Dr. Luiz Gondim – Antologia da Sociedade Artple (Grupo dos Treze)

 

 Posse Diretoria Academia de Letras e Artes do Nordeste – Dr. Nóbrega

 Posse José Maria Chaves - Academia Limoeirense de Letras – 14/03/15

 Jubileu de Ouro Sobrames Nacional–Dr. Eurico Bco Ribeiro – 17 e 18/04

 

5 - Aniversariantes do mês

07 - João de Deus

09 - Fernando Siqueira

10 - Elisa Geovani Boutala Salomão

12 - José Telles

12 - Emanuel Carvalho

13 - Marcelo Gurgel

15 - José Luciano Sidney Marques

16 - Glauber Santos Paiva

16 - Lúcio Alcântara

25 - José Teúnes

27 - Paulo Ronalth

31 - Murilo Martins

 

6 -  Palavra facultada

7 – Sorteio de livros

8 - Leitura de textos

quarta-feira, 4 de março de 2015

POSSE DE JOSÉ MARIA CHAVES NA ACADEMIA LIMOEIRENSE DE LETRAS

Dr. José Maria Chaves - Médico e Membro da Sobrames-CE
 
POSSE DE DR. JOSÉ MARIA CHAVES NA ACADEMIA LIMOEIRENSE DE LETRAS

A Sobrames-CE sente-se honrada com a eleição do sobramista do Ceará e ex-Presidente da Sobrames Nacional, José Maria Chaves, para ocupar uma cadeira na Academia Limoeirense de Letras. Sua posse neste magnífico Silogeu dar-se-á no próximo dia 14 de março, o que representará, sem dúvida, mais uma importante aquisição entre tantos valores. Nossos sinceros parabéns ao colega José Maria Chaves por mais esta conquista, extensivos à toda sua família.

Em nome da Diretoria e de todos os sobramistas da Regional Ceará

Celina Côrte Pinheiro
Presidente da Sobrames-CE

POR: WILLIAM MOFFITT HARRIS - AUTOBIOGRAFIA





Dr. William Moffitt Harris - Médico e Membro da Sobrames-CE

AUTOBIOGRAFIA DO DR. WILLIAM MOFFITT HARRIS ESCRITA NO ANO DE 2015


 

          Escrevo esta minha autobiografia com a finalidade precípua de me apresentar de uma forma mais completa aos caros companheiros de letras  da Sobrames-CE, uma vez que senti que despertei certa curiosidade de alguns colegas literatos com minha fala, ao receber uma homenagem na cidade de Fortaleza, em 2014, por ocasião de nossa confraternização anual. Um ou outro manifestou certa repulsa ao que eu tinha a dizer, enquanto outros elogiaram a franqueza de minhas palavras.
 
           Sou, primordialmente, pediatra sanitarista, nascido em 1935 na cidade de São Paulo, descendente de  irlandeses, lituanos, australianos e londrinos. Meu pai era judeu e minha mãe anglicana. Eu e meus irmãos fomos criados  como anglicanos e meu pai fazia questão de nos levar todos os domingos à Missa das dez da manhã na Igreja Anglicana de São Paulo, perto da Estação da Luz. Tanto a Igreja, quanto a estação, foram construídas na década de 1860 pelos engenheiros britânicos da "São Paulo Railway", a futura Estrada de Ferro Santos-Jundiaí. 
          Papai sentava num lugar que lhe era cativo; ficava sob a placa em memória do Revdo. Morray-Jones, a quem muito admirava. Conheceu-o no Rio de Janeiro em 1929 quando trabalhava na Phillips do Brasil.  Ficava extremamente emocionado com a maneira dele, ao subir no púlpito, vociferar bem alto "Trago-lhes Boas Novas". Na mesma época conheceu o Revdo. William Moffitt que se tornou muito seu amigo e companheiro de folguedos. Jogavam bilhar, golfe, xadrez; iam ao teatro, a concertos e cinema quando havia filmes bons, fora um bom whisky escocês que ambos apreciavam. A sua amizade durou pouco mais de um ano, pois numa tarde de domingo, sob um sol escaldante, meu xará, ao dar a partida no seu Ford 28 com a alavanca na frente do veículo, caiu morto nos braços do meu pai. Eram aproximadamente da mesma idade, entre trinta e cinco e quarenta anos. Iam juntos todos os domingos, na parte da manhã, para a Igreja Anglicana (Christ Church) na Rua Evaristo da Veiga.  A devoção deste padre a Jesus Cristo e a ênfase do capelão no púlpito ao pronunciar suas homilias com convicção e lógica em seus raciocínios foram as pedras fundamentais para sua futura conversão em 1951. 
          Às vezes, eu tinha de chegar mais cedo porque a partir de minha crisma, aos doze anos de idade, fui elevado à condição de coroinha  formado. A partir do ano seguinte, fiquei aluno interno dos Irmãos Maristas e somente podia exercer esta função nas férias e fins de semana. Na Igreja tinha como companheiros Brian Fuller, Franck Olaf Whitton, John Roderick Govier, Anthony McCullough, e mais um ou dois cujos nomes não me lembro no momento, com os quais alternava esta função dentro de uma escala cuidadosamente organizada pelo Revdo. Benjamin J. Townsend.  
 
          Meu pai era judeu de origem lituana por parte de minha bisavó que conseguiu fugir com os filhos e amigos, via Polônia, dos "progroms" dos cossacos russos em meados de 1850. Estes cossacos eram cavalarianos da elite russa que atravessavam os Montes Urais em fins de semana e se divertiam indo às pequenas comunidades judias dos países bálticos e mesmo na Geórgia, decapitando homens, mulheres e crianças com seus longos sabres, além de eliminarem seus animais que lhes forneciam leite, ovos e carne. Os judeus, aos sábados (dia do Senhor), naquela época, não reagiam, nem acendiam fogueiras e consideravam esta morte violenta seu carma.
          Aqueles meus antepassados viajaram em navios de cabotagem, após atravessar a pé o noroeste da Polônia, trocando de embarcações a custa de joias e dinheiro que portavam. Eram viagens longas e sofridas com alguns óbitos a se lamentar ao longo dos dois a três meses de caminhada até chegarem à Inglaterra. Lá, como era costume na época, ao receberem os imigrantes de povos eslavos, era-lhes apresentada uma lista de nomes comuns para renovarem  ou mesmo receberem documentos, pois seus nomes eram compridos e impronunciáveis para o cidadão inglês comum. Meu pai sempre dizia que o sobrenome dos seus antepassados tinha quatorze consoantes e duas ou três vogais. Chegou a registrá-lo num dos livros de nossa biblioteca, mas tanto eu, quanto meu irmão Walter percorremos boa parte da Enciclopédia Britânica (edição de 1927) como também nossas diversas Bíblias, sem nunca encontrá-lo. Meu pai nunca foi judeu ortodoxo, embora criado num orfanato da colônia judia em Londres dos 6 aos 14 anos de idade. Com a internação do meu avô num hospício, minha avó Sophia não teve condições financeiras de manter a casa com as três crianças e aceitou  internar meu pai por caridade de seu povo. Cerca de quatro anos depois meu avô faleceu.
          Dos 14 aos 16 anos de idade, meu pai foi aprendiz numa firma de engenharia elétrica e depois, em 1910, rumou para Buenos Aires onde ficou hospedado na Associação Cristã de Moços – ACM, permutando aulas de educação física por cama e comida. Ele era muito forte e de compleição atlética, pois havia se saído muito bem em competições escolares na zona leste de Londres na modalidade de argolas olímpicas. Enquanto isto, a ACM arrumou-lhe trabalho como funcionário eletricista numa empresa ferroviária. Sempre nos contava como o cometa Halley, com sua enorme cauda brilhando no céu, o acompanhou em sua viagem de três semanas para a América do Sul.  Por coincidência, seu futuro sogro veio, à mesma época, para o Brasil em outra embarcação. Conheceram-se apenas em 1934.

          Papai casou-se na Igreja Anglicana e lá fomos criados. Quando eu estava no primeiro colegial em São Paulo, em 1951, ele foi batizado no Rio de Janeiro com água do Rio Jordão pelo Revdo. Charles S. Neale  que havia sido nosso pároco em São Paulo. Eu, de minha parte, me transferi para a Igreja Católica Apostólica Romana para poder me casar com minha esposa, há 55 anos atrás. Seu primo, Monsenhor Antonio Mariano, não admitia casamentos mistos em sua igreja no altar-mor e, baixinho como era, quase teve de trepar num banquinho para me batizar. Antes, porém, discuti com ele a validade do meu batismo na Igreja Anglicana. Hesitou ao me fornecer o certificado de batismo e escreveu em baixo sub conditionem.


          Eu era um molequinho taludo em 1939 e dei muito trabalho no primeiro dia de aula no Jardim de Infância da Escola Graduada de São Paulo (São Paulo Graded School) na Rua Cel. Oscar Porto, quase derrubando a porta de madeira aos berros e pontapés. Graças aos esforços braçais de minha mãe e da minha primeira professora e titular da classe Olga Green de Oliveira, acalmaram-me e  seduziram-me com um pirulito cujo gosto de framboesa sinto até hoje na boca. D. Olga e a titular da série seguinte, Mrs. Anne B. Shermann foram adaptando, conforme exigências culturais da época, o  modelo do Kindergarten, o primeiro jardim de infância do Brasil, inaugurado por D. Pedro II em São Paulo na Escola Americana - Mackenzie College, em 1878.  O Graded School", conforme era conhecido, foi fundado em 1920 pelas professoras Ruth Kolb e Bel Ribble de famílias missionárias presbiterianas. 

           Nestes três anos de jardim de infância e pré-primário tive como colegas de escola dois futuros contemporâneos da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Pinheiros): Armando de Aguiar Pupo (R.I.P.) e Michael Pink (R.I.P.).  Frequentei, também, a Escola Americana - Mackenzie College, onde fui parar umas três vezes na Diretoria à presença de Miss Ida Eloise Kolb.  Foi preciso até chamar minha mãe a fim de me colocarem em meu devido lugar. Tornaram-se muito amigas devido à afinidade linguística, apesar dos incidentes de pugilato infantil. Fiz meus estudos primários em várias escolas, pois meu pai cansava de receber queixas a respeito do meu comportamento belicoso com os colegas. De nada valia a pancadaria quando chegávamos à nossa casa, principalmente quando levava a pior e os olhos estavam inchados por causa dos socos dos outros meninos.
 
          A seguir, estudei na Escola Britânica St. Paul's School.  Lá, Mr. Charles Hindley tinha uma varinha em seu escritório reservado para peraltas como eu... Fiquei com meu irmão Johnny, ele duas séries na minha retaguarda, na Escola Britânica até a 1ª série ginasial. O educandário foi forçado, como outras grandes instituições de ensino de língua estrangeira, a mudar seu nome para Ginásio Anglo-Paulistano por exigência ditatorial nacionalista, na era getuliana, durante a Segunda Guerra Mundial.  Fui aluno de Algacyr Munhoz Maeder, Aroldo  de Azevedo, Haddock Lobo, João Julião e outros famosos didatas da futura Faculdade de Filosofia da USP. Sinto saudades daqueles tempos. D.Irene Teixeira Nogueira Florence, a muito temida e eficiente secretária, era uma sobrinha neta de Hercules Florence e uma distante contraparente da minha esposa Maria Lúcia.

           Foi lá que recebi meu primeiro prêmio em Literatura. Tinha doze anos de idade quando fui classificado em segundo lugar em Literatura Inglesa. Presentearam-me com o livro de Alexandre Dumas "Os três mosqueteiros" que é uma das relíquias de nossa biblioteca aqui em casa.  Na contracapa há uma nota do Papai: "Bravo, Billy! Daddy. 28-Nov-1947". Quando criança, meu pai me obrigava a devorar os principais clássicos da língua inglesa, fossem ingleses, americanos, irlandeses, escoceses e até mesmo traduções da literatura internacional para este idioma. Ensinava-me fatos da vida destes autores e os contextos das épocas em que viveram e escreveram.. Ele sempre foi um árduo leitor, principalmente da Enciclopédia Britânica, e era uma pessoa de extraordinária cultura geral e um exemplo para seus filhos.

           A partir de 1948,  aos 13 anos de idade, fui interno do Ginásio Municipal Marista de Poços de Caldas-MG, onde terminei o curso ginasial em 1950. Lembro-me, como se fosse ontem, de minha matrícula naquele estabelecimento. O Diretor Irmão João de Deus ouviu calmamente meu pai explicar que consultara nosso bispo itinerante da Igreja Anglicana onde havíamos sido batizados e que era de origem judaica e maçom. Portanto, estávamos em terrenos opostos etc..   Infelizmente, meu pai, na presença do Diretor deu-me um tapa na orelha (sinto buzinar até hoje) quando respondi muito baixinho a uma de suas perguntas. O Irmão João de Deus disse, simplesmente: "Não se preocupe, Sr. Walter, temos muitos alunos judeus e protestantes aqui na escola que só assistem à Santa Missa diária se assim o desejarem. Não nos culpe se, mais tarde,  seus filhos se tornarem católicos apostólicos romanos. Nada forçaremos. Quanto à questão da maçonaria, deixemos que nossas autoridades, de ambos os lados, se entendam lá em Roma.”.
          Cinquenta anos depois, no ano 2000, organizei o Jubileu de Ouro com a colaboração de alguns colegas, minha esposa Maria Lúcia e o Padre Marcelo Prado Campos, ex-capelão do Colégio. Compareceram 85 pessoas, entre as quais 34 ex-colegas (19 já haviam falecido), incluindo cinco de nossos ex-professores. Um deles, Irmão Louis George Spies Barberet veio lá de Araçuaí-MG, no Vale do Jequitinhonha, a dezoito horas de ônibus, passando por Belo Horizonte, para chegar a tempo para a comemoração em Poços. Naquela cidade organizara com as crianças de rua uma banda de mais de 110 instrumentistas dentre os quais um grupo de destaque de cerca de trinta pifanistas. Melhorou assim o desempenho escolar do pessoalzinho, pois todos queriam fazer parte da banda e desfilar uniformizados pelas ruas nos dias de festa.  Irmão Francisco (corruptela de François), como era conhecido, veio com 16 anos ao Brasil com Irmão Fabiano (Prof. Dr. Fioravante Marta, de Uberaba) direto do Juvenato de Roma e aqui permaneceram até a morte.  Irmão Fabiano obteve seu título de mestrado na Faculdade de Santa Maria em Oxford e o doutorado em letras anglo-saxônicas na Universidade Federal de Belo Horizonte. Como não obteve licença dos seus superiores para cursar as disciplinas  necessárias na UNICAMP de Campinas-SP, abandonou a batina e acabou se casando. Ele e dona Odete estiveram na festa do ano 2000 onde nos brindou com momentos muitos alegres ao piano e ao órgão da igreja onde foi realizada a Missa de Ação de Graças. 
          A Missa de Ação de Graças foi rezada na Igreja Paroquial de Santa Cruz à qual pertence a área do colégio, uma vez que a antiga capela do colégio foi desconsagrada com a municipalização do prédio em 1989, quando terminou o contrato de comodato dos Maristas. As Intenções desta Missa foram por mim redigidas e lidas logo que o Padre Mahoney da congregação canadense dos Padres Oblatos de Maria havia chegado ao altar. Creio que dois trechos cabem nesta minha biografia: “Somos, antes de mais nada, cristãos e como muitos santos já o disseram e já o testemunharam, Cristo vive em nós. Ele está dentro de nós e não apenas no meio de nós. Este corpo que abriga nossa alma eterna é o tabernáculo do Senhor e cabe a cada um de nós cuidarmos dele e continuar a obra do Grande Arquiteto. Ele habita em nós porque é eterno e ilimitado o amor que Ele tem por nós."  e  "O que realmente conta são as coisas espirituais: o amor, a compaixão, a bondade, a compreensão, o perdão, a confiança e a generosidade. Sejamos, portanto, bem-vindos à Casa do Senhor, a Poços de Caldas, ao Colégio e demos graças a Deus por nossa fé, nossa saúde, nossa disposição e por esta magnífica ocasião. Que Deus, Nosso Senhor, abençoe eternamente os Irmãos Maristas pelas marcas indeléveis que deixaram em todos nós e que o tempo só pôde acentuar." 
          Irmão Francisco leu o Evangelho do Bom Pastor segundo S. João, cap.10º, versículos 1 a 18. O segundo texto, contido no Livro do Eclesiastes, cap. 3º, versículos 1 a 14: "Todas as coisas têm seu tempo e todas elas passam debaixo do céu segundo o tempo que a cada uma foi prescrito. Há tempo para nascer e tempo para morrer. Há tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou...", foi lido pelo colega José Affonso Junqueira Netto
          Durante a Missa, nosso colega Vitor Maywald, médico e consagrado cantor do Rio de Janeiro, recém-safenado, brindou-nos com "Adágio" de Tommaso Albinoni (1674-1745), "Panis Angelicus" de Cesar Frank (1822-1890) e "Ave Maria" de Charles Gounod  (1818-1893). Vitor fez questão de prestar esta homenagem, contudo a viagem e a emoção foram demais para ele. Mal chegando de volta ao Rio, foi hospitalizado, vindo a  falecer poucas horas depois.
          Depois da Missa, Irmão Fabiano tocou, atendendo a pedidos, a Grande Fantasia Triunfal sobre  o Hino Nacional Brasileiro de Louis Göttschalk (N.Orleans 1829 -  Rio de Janeiro 1869) que havia dedicado à sua Alteza Condessa D' Eu.  Irmão Fabiano adorava arregaçar a batina e jogar futebol com os alunos quando Irmão Marista e como ele depois se auto-elogiava "... e jogava um bom futebol!".  Irmão Francisco me lembrou, por ocasião desta festa o quanto fiquei chateado com duas notas baixas em inglês (9,5 ao invés de 10) em dois boletins mensais. Meu pai gostou e me culpou por não prestar mais atenção na leitura dos livros que vivia selecionando para mim. Outro professor de Poços de quem tenho muitas saudades é o Irmão Nemésio Calixto, regente da Divisão dos Menores, literato e estudioso do alemão, francês e inglês. Era membro da Academia Portuguesa de Letras e a cada três anos conseguia verba de uma entidade beneficente para viajar a Coimbra para apresentar seus trabalhos.  Ajudei-o bastante com seu inglês e, em contrapartida, moldou minha personalidade a partir do segundo ano que lá estive. Ensinou-me a estudar, fazer associação de imagens e ideias, melhor aproveitando assim o tempo. Eu vivia de castigo, decorando trechos enormes da literatura  de língua portuguesa a cada falta cometida de disciplina. Quando cheguei à escola, por ocasião da matrícula do meu segundo ano lá em Poços, ele disse ao meu pai ao lhe brandir um enorme molho de chaves: "Desta vez, Sr. Walter, o William não vai ter tempo para fazer arte. Aqui estão as chaves que serão de sua responsabilidade. Cada uma delas tem uma etiqueta dizendo de onde são. Vai distribuir, recolher, engraxar e guardar as bolas de futebol, basquete e vôlei, juntar as bolas e tacos de snooker, policiar o fluxo dos alunos pelos pátios, principalmente na entrada das casinhas onde só poderão entrar de um em um etc..". Irmão Nemésio tornou-se muito amigo de meu pai e ia lá em casa todas as vezes que viajava com o caminhão da escola a São Paulo para fazer compras no Mercado Central de Pinheiros, no Largo da Batata. Exerceu a função de ecônomo até que sua diabetes o levou à presença do Senhor.  Meu pai arrumou consultas para ele com Drs. Brickmann e Schroeder, excelentes clínicos gerais, amigos de nossa família. 
          Sou essencialmente, o que é mais ou menos óbvio, um memorialista e saudosista e, frequentemente, me recordo de outros ilustres professores e colegas que tive ao longo dos anos. Aos 15 anos e meio me matriculei no Colégio Marista  Arquidiocesano de São Paulo onde fui muito bem preparado para enfrentar meu único vestibular em 1954 para a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP.  Formei-me em 1960 e, em meados de 1961, rumei para Osvaldo Cruz no interior de São Paulo onde exerci a Clínica Geral por dois anos. Fui para o interior por sugestão do médico que me trouxe ao mundo e que tanto me ajudou financeiramente e como conselheiro durante meu curso de medicina, Dr. Thomas Russell Warren, irlandês, do Hospital Samaritano.  Minha intenção inicial era ir trabalhar com Dr. Albert Schweitzer, em Lambarènè, no Alto Volta na antiga África Equatorial Francesa (hoje Gabão) quando li seu livro "Entre a Água e a Selva" aos dezesseis anos de idade.
          Em Osvaldo Cruz, nasceu nossa primeira filha, Ana Lúcia, que hoje é arquiteta-urbanista, com doutorado  em engenharia civil pela Escola Politécnica da USP e professora há duas décadas na UNICAMP. Por razões familiares, vim de volta a Campinas onde a família da Maria Lúcia residia e logo entrei para o serviço público  estadual em agosto de 1963 num Posto de Puericultura do extinto Departamento Estadual da Criança. 
          Em 1969, em tempo integral, acompanhei o Curso de Especialização em Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública da USP (antigo Instituto de Higiene e Saúde Pública). Muitos de meus professores, companheiros do Departamento de Saúde Materno-Infantil, onde lecionei, mais tarde, de 1974 a 1995, e de alguns de outros departamentos tornaram-se meus amigos. Só para citar alguns: Cornélio Pedroso Rosenburg, Donald Wilson, Arnaldo Augusto Franco de Siqueira, Isabel Maria Bicudo Pereira, Luzimar Raimundo Teixeira, Reinaldo Ramos, José Divino Lopes Filho, Alfredo Reis Viegas e João Alvécio Sossai. Durante o período em que trabalhei meio período na Faculdade de Saúde Pública, tive como orientador de minha dissertação de mestrado e tese de doutorado, o Prof. Rosenburg que também me chefiava no Departamento de Saúde Escolar da Prefeitura Municipal de São Paulo no resto do dia.

          Tanto na Secretaria da Saúde do Estado, na Divisão Regional de Saúde de Campinas e do Vale do Paraíba, e nas Secretarias da Saúde e da Educação do Município de São Paulo, exerci diversos cargos de chefia técnica e de direção, ora na função assistencial assessora, ora na linha executiva. Acabei me interessando mais pela área de saúde escolar em suas quatro vertentes (saúde da criança, saúde dos professores e dos funcionários não docentes, da área física e saneamento básico da escola e da integração lar-escola-comunidade). Em 1984, classifiquei-me em primeiro lugar no concurso público para provimento efetivo de Médico de Saúde Escolar. Havia 80 vagas e 1.242 candidatos.
          Além do Curso de Saúde Pública, frequentei por três meses, em 1971, também em tempo integral, o Curso de Especialização em Planejamento Setorial de Saúde sob a batuta dos Profs. Reinaldo Ramos e Aldo da Fonseca Tinoco, assim como  o Curso de Especialização de Higiene, Segurança e Medicina do Trabalho para Médicos da FUNDACENTRO, cujos coordenadores Profs. Diogo Pupo Nogueira e Jorge Rocha Gomes muito me honraram com sua amizade nos anos seguintes. Levei muitos diapositivos feitos às minhas custas a partir de fotografias que tirei para ilustrar condições inseguras em escolas que fui visitar ao longo de minhas funções enquanto trabalhava como médico de saúde escolar. Por coincidência, Professor Diogo e minha esposa tiveram o mesmo bisavô, Cel. Luciano Teixeira Nogueira que teve trinta e quatro filhos com duas esposas. Quando seu filho mais velho, Major Francisco de Paula, morreu na Guerra do Paraguai, colocou o mesmo nome num dos seus últimos e que foi o avô da Maria Lúcia.
  
           Em 1971 e 1972, trabalhei por cerca de um ano e meio como assessor técnico-administrativo da Divisão Médica do Departamento Regional de São Paulo do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial - SENAI onde muito aprendi sobre a preparação de aprendizes de 14 a 18 anos de idade. Tendo frequentado o Curso de Especialização em Saúde Pública, o de Planejamento Setorial de Saúde e o da FUNDACENTRO, fui considerado apto a desenvolver, na linha executiva, um plano diretor de rearranjo sanitário das escolas do SENAI, a pedido do seu Diretor Geral, Dr. Paulo Ernesto Tolle, ex-diretor do Instituto Tecnológico da Aeronáutica de São José dos Campos – ITA. Quando Secretário da Educação da Prefeitura Municipal de São Paulo, Dr. Paulo Ernesto conheceu Dr. Rosenburg. Chamou meu caro orientador e este, após uma semana, preparou com os Profs. Reinaldo Ramos e Aldo da Fonseca Tinoco o contrato que finalizou um estudo que já vinham fazendo durante três meses de um projeto de saúde pública para o SENAI estadual de São Paulo. Assinado o contrato entre a Prefeitura e a Faculdade de Saúde Pública, fui indicado e aceitei a incumbência de ser o coordenador executivo do projeto, devendo mensalmente fornecer um relatório, tanto para a comissão dos três professores, como para a Diretoria do SENAI. Neste ínterim, fiquei afastado da Faculdade, em licença não remunerada. Dr. Paulo Tolle foi de uma amabilidade  extraordinária, mostrando muito interesse no progresso de minha atuação. Deu algumas sugestões e passou por cima da burocracia hierárquica da Divisão Médica, o que gerou algumas confusões e ciumeira a ponto de atritarmos algumas vezes. Meus superiores formais hierárquicos, médicos antigos da instituição, não entendiam as providências que eu estava tomando e urravam com meus comentários no relatório mensal que eu batia em cinco vias em papel de seda. Não compreendiam a filosofia preventivista do sanitarista e enfocavam seu trabalho e dos médicos da rede de forma puramente assistencial e clínica. Não era culpa deles e fora os detalhes técnicos, eu me dava muito bem com os colegas Octávio Siqueira Cunha e Drs. Béllio e José Alvarenga. Nos intervalos do almoço, quando eu estava na sede na Alameda Barão de Limeira, observava-os nos embates de xadrez. 
          Chamou-me muito a atenção a personalidade e  atuação do colega Prof. Dr. José Rosemberg, futuro diretor da Faculdade de Medicina de Sorocaba. Foi extremamente gentil comigo quando fui ao seu apartamento, perto da Praça Buenos Aires em Higienópolis, a fim de convidá-lo a um encontro científico com  Dr. Rosenburg na Faculdade de Saúde Pública, a ser mediado pelo Professor Diógenes Augusto Certain, catedrático de Tisiologia e Pneumologia Sanitária a fim de dirimirmos algumas dúvidas técnicas relativas às vantagens da Rt-23 de Kopenhagen e abandonar por completo a OT (Old Tuberculin) oral e introduzir  o PPD no lugar do Mantoux. Aprendi muito neste debate que durou mais de três horas, na presença de alguns alunos de pós-graduação que participaram levando suas dúvidas. Concordou em ajudar, onde possível, num levantamento nos alunos pelo PPD quanto à infectividade da tuberculose, mesmo contra suas próprias convicções, baseadas em trabalhos feitos em conjunto com o Prof. Dr. Arlindo de Assis do Instituto Oswaldo Cruz, em Manguinhos, no Rio de Janeiro. Mais tarde fotografei amostras  das diversas fases (7) da evolução da cicatriz vacinal  do BCG intradérmico aplicado nos não reatores durante uma pesquisa de três meses, traçando curvas quanto a sua duração, trabalho este que apresentei no concurso de efetivação como docente da Faculdade em 1974. De lá me aposentei em 1995. Durante este período obtive meus títulos de mestrado e de doutorado em Saúde Pública.
          Em 1977, estive por dois meses e meio no Institute for Development Studies da Universidade de Sussex na cidade de Falmer, perto de Londres, participando de um curso de extensão em Planejamento no Setor Saúde com a Comunidade. Fui com bolsa da British and Commonwealth Community Council de São Paulo. Havia cerca de sessenta alunos na minha turma, advindos de quarenta e um países dos cinco continentes. Em três dos fins de semana, fui cicerone e intérprete para subgrupos de cerca de dez colegas. Conhecia bem Londres pelas narrativas do meu pai e de filmes e fotografias que tínhamos em casa, além de relatos de viagens de outros professores que lá estiveram. Foi com viva emoção que fiquei ao lado de uma das patas de um dos leões do monumento ao Almirante Lord Nelson, na praça Trafalgar, sobre o qual, aos dez anos de idade, em 1904, meu pai havia sentado.
          Em 1979, durante a gestão do Diretor da Faculdade de Saúde Pública, Prof. Dr. Walter Engrácia de Oliveira, fui oficialmente convidado para ser entrevistado em Washington na sede da Organização Panamericana da Saúde - OPS. Havia vindo para o Brasil, na função de head-hunter, buscando pessoal técnico, um simpático senhor de seus setenta anos, Dr. Carlos, professor catedrático aposentado de saúde pública da Universidade Central do México. Ambos me disseram na Diretoria que eu tinha as qualificações suficientes e havia sido altamente recomendado por vários setores da Faculdade para as funções que iria exercer em Washington. Tinha, no entanto que aguardar o convite oficial e a passagem. Voltando ao departamento onde era docente, Prof. Dr.Cyro Ciari, então chefe, disse-me de forma bem clara que ele havia, numa reunião com o Diretor, alguns dias antes, feito a indicação, muito embora houvesse na Faculdade gente bem mais qualificada para o cargo. Eu era apenas um mero mestre e que nem proposta para a tese de doutoramento havia ainda apresentado ao Conselho do Departamento. Cerca de seis meses depois, numa quinta-feira, a Faculdade recebeu um telegrama de Washington dizendo que eu deveria me apresentar no gabinete do Diretor Hector Acuña na próxima segunda-feira, pontualmente às 10h locais, a fim de tratar de assuntos do meu interesse. Nem o passaporte eu havia renovado e de acordo com as normas daquela época teria de tirar outro. Com um telefonema confidencial, Dr. Cyro explicou o caso para seu amigo particular, o delegado Dr. Nicolau Tuma, e este pediu que eu fosse, no dia seguinte, com três fotografias do tamanho adequado ao seu gabinete que ele me entregaria o documento em mãos. Foi um milagre porque a demora normal seria de pelo menos um mês. O telegrama da OPS explicitava a companhia aérea e as informações sobre o bilhete que deveria retirar no check-in, além do hotel Riverside, às margens do Rio Potomac, onde haviam feito reservas.
          No dia e hora aprazados, bati na porta do Diretor. "Entre Dr. Harris!"- ele respondeu. Encontrava-se à mesa assinando alguns papéis com a secretária e me mandou sentar e aguardar um minutinho.  Falava um portunhol e eu me arrisquei a conversar com meus parcos conhecimentos de castelhano. Interrompeu-me e, num inglês escorreito, disse-me francamente. "Seu castelhano é terrível mas aqui em pouco tempo o senhor haverá de aprendê-lo...". Apresentou-se. Em linhas gerais, era reitor afastado da Universidade Iberoamericana Torreón-Laguna do México e teve de abrir mão dos seus vencimentos para ganhar um pouco mais do que a metade enquanto trabalhava na OPS.  Era um cristão religioso e caridoso, por tudo que pude mais tarde apreender. Passou a elogiar meu currículo e mostrou interesse em minhas atividades na Prefeitura, na Secretaria de Estado da Saúde e no SENAI como pessoa exercendo cargos de chefia técnica e de direção. Eu lhe disse que Dr.Cyro Ciari, quem ele já conhecia de congressos de ginecologia e obstetrícia e de saúde pública no México, Venezuela, Chile e em São Paulo, incumbira-me de lhe dizer que esperava que minha atuação em Washington, junto a OPS, viesse a gerar convênios ativando projetos na área materno-infantil, foco principal do nosso departamento em São Paulo. Explicou-me em linhas gerais que um dos objetivos daquele terceiro mandato dele como Diretor era reformular a infraestrutura da OPS, criando uma forma menos burocrática e mais flexível no inter-relacionamento dos diversos setores envolvidos e garantir mais rapidez e eficiência no atendimento às emergências dentro da área geográfica sob sua responsabilidade.  Vislumbrava para mim o cargo de Chefe da Seção Materna e da Criança ou, eventualmente, de assessor em seu gabinete.
          Em seguida, percorrendo os corredores, foi me apresentando e agendando entrevistas com vários chefes de seções, começando aquela tarde. Foram sete as entrevistas. Seria um pouco enfadonho descrever as minúcias de cada uma das entrevistas e pretendo não incorrer em descrições antiéticas em que as pessoas poderiam ser identificadas. Tenho a dizer que foi uma experiência notável que me enriqueceu quanto ao conhecimento do funcionamento da OPS, seus sucessos e algumas falhas. Senti que havia certa preocupação em termos de promoção pessoal e poucos trabalhos de equipe publicados. Um dos chefes de seção confessou não ter tido tempo para me receber e queria que eu conduzisse a entrevista, uma vez que era meio avesso a repórteres. Relaxou quando lhe expliquei como fui convidado e que não havia qualquer compromisso de parte a parte. Lembrei-me de alguns princípios e de como conduzir uma entrevista dados em aula pela Profª. Dra. Ruth Sandoval Marcondes da Faculdade de Saúde Pública e fomos bem sucedidos. Depois de tantos anos, fogem-me alguns detalhes, mas sei que passei pelas chefias de quase todas as seções técnicas e depois a administrativa geral. Assim, fiquei conhecendo alguns aspectos de pesquisas e subprogramas em andamento das áreas de saneamento básico, abastecimento em situações de risco e calamidade, saúde da mulher, saúde da criança, epidemiologia, tuberculose, hanseníase, moléstias infectocontagiosas em geral e as ideias de integração sanitária que tanto preocupavam Dr. Acuña. Lembro-me de que pensava em dar um pulinho em São Paulo para bater um papo com Prof. Walter Sidnei Pereira Leser sobre a reforma sanitária em curso no Estado de São Paulo. Das entrevistas, a que mais ficou marcada em minha memória foi a de epidemiologia.  O colega  estava tremendamente ocupado, desenhando dois gráficos e não me deu muita atenção enquanto eu estava de pé a sua frente. Fiquei parado ali por alguns minutos e ousei olhar o que ele estava fazendo. Marcava cuidadosamente pontos que posteriormente seriam unidos. Não me lembro se eram gráficos de incidência e de prevalência de sarampo, polio ou gripe suína que grassavam naquela época nos Estados Unidos. Percebi que num dos gráficos havia uma deflexão, enquanto no outro, para o mesmo mês, havia uma inflexão.  Pedi licença e apontei o seu equívoco. Ficou uma vara! "Ustedes veio aqui para ser entrevistado e não fiscalizar nosso trabalho; não necessitamos de aulas no nosso mister..." ou coisa parecida. Pedi desculpas, pois pretendia colaborar e não atrapalhar. Tremia de raiva e encurtou logo a entrevista. 
           Outra coisa negativa que me impressionou foi  o grande segredo sobre determinados equipamentos de oxigenação ambiental ou de ar comprimido que o encarregado não quis me mostrar.  Liguei para Dr.Acuña que desceu imediatamente, interrompendo uma reunião, pegou a chave num armário e mandou o encarregado abrir a seção. Mostrou-me pessoalmente todo o material e disse-me que haviam importado este equipamento novíssimo da Alemanha, via OMS, e que não havia sido ainda testado.  Haveria ainda medidas burocráticas a serem tomadas a fim de liberá-lo. Hoje penso que eram concentradores de oxigênio até mesmo de uso doméstico. Há uns seis anos atrás, quando minha esposa utilizou aparelhos semelhantes durante três anos, dia e noite, cerca de mil e oitocentos pessoas já se utilizavam deles na região de Campinas. 
          No fim da semana, na sexta-feira, Dr. Acuña me chamou na sua sala e me expôs as conclusões de todos seus colaboradores, com quem havia se reunido à noite, na véspera, pois achava que eu iria voltar para o  Brasil no sábado. Foi direto ao ponto. Elogiaram minhas argumentações técnicas em todas as áreas, mas ficou patente que eu não tinha muito tato político ou diplomático e precisava receber treinamento e monitoria nestas áreas. Foi-me sugerido um estágio em Bermudas de um ou dois anos para conhecer melhor o inter-relacionamento de funcionários da organização. Recusei de pronto, pois tinha cinco filhos e a mais velha já a caminho da universidade.  Para Dr.Acuña, isto não seria problema, pois a família ficaria em Caracas, sem despesas, enquanto eu viajasse duas vezes por semana pela ponte aérea (shuttle flight) para vê-la. Insistiu bastante para que consultasse a esposa.
          Passei pelo setor administrativo para carimbar minha passagem de volta e o pessoal de lá quase caiu duro, pois eu deveria ter feito isto quando fora aos Estados Unidos, visto ter sido em período de férias escolares. Ficou claro para todos que houve falha de comunicação entre os diversos setores da OPS quanto à minha visita. Tive até de mudar de apartamento no hotel, ou melhor, já tinham apanhado meus pertences e colocado com todo o cuidado em minha mala, pois o hóspede seguinte havia chegado. Fiquei mais três dias além do programado e nada tinha para fazer a não ser passear beirando e observando o Potomac, enquanto conversava com antigos moradores que me contaram histórias e me mostraram marcas da grande ressaca de 1936. Comia fora, enquanto aguardava notícias da reserva em um avião boliviano que iria para  La Paz. Lá, aguardaria vaga, por um ou dois dias, em avião da Pan American para São Paulo. Na saída do hotel, deixei uma pilha de livros e revistas que o pessoal da OPS havia me incumbido de levar para a Faculdade.  Os funcionários do hotel foram muito amáveis em providenciar a remessa diretamente para o Diretor sem nada me cobrar. Teriam uma previsão orçamentária para pequenas despesas deste tipo face ao convênio que tinham com a Organização.
Ao chegar para o check-in do aeroporto, comecei a me sentir mal. Uma tremedeira daquelas! No serviço de enfermagem, constaram que eu estava subfebril, uns meros 37,5 mais ou menos, e me dispensaram, contudo alertando-me que se eu apresentasse sintomatologia gripal, poderia ser a gripe suína que era de notificação compulsória. Estava escurecendo quando aterrissamos em Santa Cruz de la Sierra e vi pela janela que um avião da Cruzeiro do Sul estava se preparando para partir. Uma das hélices do bimotor já estava sendo acionado. Saí do avião com os passageiros que iam descer naquele aeroporto e corri para o balcão indagando se aquele avião estava indo para o Brasil e se havia lugar para mim.  Estava pálido, tremendo de febre, desesperado, cansado pela péssima viagem e, com a afirmativa, implorei para que me deixassem ir embora. "Mas a sua bagagem??"  Nem deixei a moça terminar a frase. "Fiquem com a bagagem de presente. Só tem roupas e alguns livros."   Pararam o avião, que atrasou uma meia hora, pois fizeram questão que eu embarcasse com minha mala. No pescoço, carregava uma sacola com minha máquina fotográfica  e alguns documentos importantes. Pedi a eles que passassem um cabograma ou telefonema para  meus familiares em Campinas a fim de me pegarem no aeroporto já que iam para lá.  Alguns dias depois, uma funcionária da OPS telefonou  querendo saber se estava tudo bem. Contou que Dr. Acuña estava preocupado porque um funcionário do aeroporto ligado ao comissariado de polícia havia ligado para lá, porque eu portava no pescoço um crachá da OPS, com meu nome e período de frequência à instituição. Embora estivesse bem vestido, estava tremendo de febre e agitado, causando, provavelmente, má impressão.

          Na segunda-feira, liguei para a Faculdade pedindo que avisassem Dr.Cyro que eu estava de cama com muita febre e dor no corpo inteiro, mormente as juntas. Deram-me então a triste notícia de que ele havia falecido no sábado de um enfarte súbito e violento. Ninguém em casa ficou doente, nem sequer minha esposa que dormia na mesma cama. A febre foi muito alta, quase 41 graus e o mal estar muito desagradável além dar dor nas articulações e ossos. Após uma semana, embora fraco, voltei a trabalhar. Alguns anos depois, o Prof. Dr. José Maria Ferreira, infectologista e assistente do Prof. Veronesi, disse-me que, com toda a certeza, eu tive dengue e não gripe suína que até se assemelha um pouco pela sintomatologia. Interrogando-me em termos anamnésticos, lembrei-me de que havia ficado sentado no aeroporto do Panamá por seis horas, aguardando  a conexão para Washington. Percorrendo exemplares antigos do boletim epidemiológico da OPS, verificamos que justo naquela ocasião o Panamá e países vizinhos estavam sofrendo muito com a dengue. Recebi algumas boas picadas e disto me lembrei. O pessoal auxiliar do aeroporto estava circulando uma garrafa com uma solução alcoólica que passamos com as mãos nas picadas. Dezessete anos depois, liguei para Dra. Luiza, do Instituto Adolfo Lutz, que cuidava da Seção de Virologia, já que eu me encontrava receoso de pegar a dengue hemorrágica, já que grassava  então uma séria epidemia em Campinas. Disse-me que provavelmente estaria com IGG em níveis protetores contra aquele de 1979 e que de lá a esta data houve muitas mutações do vírus e dificilmente corria aquele risco. Era o conceito da época.
          Recebi a visita na minha sala do Prof. Dr. João Yunes alguns dias depois que voltei da OPS. Eu tinha acabado de conversar com Dr. Carlos Serrano, antigo servidor da OPS que estava cuidando de sua papelada na Faculdade e visitando alguns amigos que havia deixado tempos atrás. Estava para aposentar. Dr.Yunes já conhecia o pessoal da OPS em seus entrosamentos como Secretário Geral do Ministério da Saúde e voltara para a Faculdade para terminar sua docência. Ambos disseram que eu fizera uma grande besteira ao recusar um bom emprego com um inicial de quinze mil dólares anuais e o triplo ao aposentar quinze anos depois. O estágio nas Bermudas seria no máximo de três meses a fim de conhecer e usar a papelada e a rotina dos fluxos de documentos. Poucos meses depois, soube que Dr. Yunes estava lá trabalhando no cargo a mim oferecido. Após cinco anos, ele voltou para São Paulo a fim de assumir a Secretaria de Estado da Saúde do Governo Franco Montoro e daí a poucos anos foi eleito Diretor da Faculdade de Saúde Pública, por unanimidade da Congregação. Faleceu de câncer pulmonar, enquanto no cargo. Cheguei a conversar poucos meses antes com ele. Estava sentido porque nunca fumara, a não ser passivamente, em reuniões esfumaçadas da OPS.  Com seu falecimento, a OPS proibiu, definitivamente, o fumo em suas dependências. Os funcionários, após algum tempo, acabaram por desistir de fugir à rua para dar algumas tragadas e voltar correndo ao trabalho.
          Cerca de seis ou sete anos depois, recebi um convite da regional da Organização Mundial da Saúde para trabalhar num de seus escritórios de língua portuguesa na África e que havia sido indicado num dos periódicos internacionais da Organização. Minhas quatro filhas estavam todas bem encaminhadas e havíamos perdido o Dado. Minha esposa e eu resolvemos continuar erigindo nosso próprio destino aqui em Campinas mesmo. Mandei-lhes uma carta agradecendo o convite.

          Fui cofundador da Associação Brasileira de Saúde Escolar – ABRASE, em 1984, num congresso de Pediatria Sanitária no Hotel Glória e coordenador na montagem de quatro eventos na área, um em Vitória-ES, em 1988, um no Rio de Janeiro, em 1991, dois em São Paulo, em 1989 e 1992, durante minhas gestões como Presidente da entidade. Fundei e dirigi por nove anos a Revista Brasileira de Saúde Escolar, periódico bianual (sete fascículos em três volumes, nos anos 1990, 1992 e 1994), contando sempre com a colaboração dos professores de educação física e experts em computação eletrônica, Luzimar Raimundo Teixeira e Pascoal Luiz Tambucci, do Departamento de Educação Física da USP. Por ocasião da fundação da ABRASE, havia trinta e quatro colegas e ao término de minha segunda gestão já se somavam mil e duzentos associados, entre pessoas físicas e jurídicas (unidades sanitárias, escolas particulares e públicas, departamentos e seções de saúde escolar de governos municipais e  estaduais, etc.)

          Durante minha segunda gestão, a equipe da ABRASE e professores de outras universidades e instituições formais e entidades informais foi, finalmente, após anos de luta com muitas reuniões, circulares, boletins e revistas, derrubada a vergonhosa e equivocada exigência nacional do exame médico para fins das aulas de educação física escolar (prevista no Art.12o do Decreto Federal 69450 de 1 de novembro de 1971).  Participaram nesta luta a Sociedade de Pediatria de São Paulo de cujo Comitê de Saúde Escolar fui coordenador em duas gestões, a Sociedade Brasileira de Pediatria, o Governo do Estado do Paraná que, assessorado pelo médico Gerson Zanetta de Lima a quem historicamente cabe a primazia da preocupação com esta farsa, baixou a Resolução 1795 de 9 de maio de 1985 eliminando a obrigatoriedade destes exames. Seu artigo, publicado pela editora Cortez em 1986 em colaboração com B.Turini (Cadernos CEDES,15) "Exame periódico para educação física vale à pena?"  Diga-se de passagem, que o Decreto Federal 69450/71 em seu Art.12o  fala em "exame clínico" e não apenas "exame físico" ou "exame médico". A diferença reside na indispensabilidade da anamnese com todo um interrogatório relativo a antecedentes mórbidos pessoais e familiares da criança.  Caso contrário, o cenário montado é o de uma verdadeira "veterinária pediátrica" ou "pediatria veterinária". Em duas ocasiões, tomei conhecimento que indivíduos formados em medicina teriam examinado numa tarde um total de aproximadamente trezentas crianças no pátio coberto da escola ou no campo de futebol, independentemente do barulho do tráfego em torno do estabelecimento.  Durante suas aulas de cardiologia clínica, nosso professor Luiz Venère Décourt várias vezes mencionou que o ouvido cansava após a vigésima ausculta seguida e levava horas para se recuperar.

          Na evolução dos acontecimentos, tiveram marcante influência a Carta de Vitória e A Mensagem de São Paulo, subprodutos de congressos da ABRASE, além de duas reuniões na residência da Dra. Zilda Arns, em Curitiba, berço e sede da Pastoral da Criança. Nestas reuniões, estiveram além da dona da casa e minha pessoa, Dr. Gerson Zanetta de  Lima, Dr. Paulo Cesar de Almeida Mattos do Rio de Janeiro, João Luiz Kobel de Campinas e Presidente da APSE, além de um filho médico da Dra. Arns. A preclara e dedicada médica sanitarista, Dra Zilda Arns, teve papel preponderante em Brasília ao conseguir a anulação, junto ao Ministério da Saúde, do parágrafo do decreto e depois a aprovação de nova lei que regulamentou a extinção desta farsa e infeliz equívoco.
 

          O assunto foi também muito debatido em reuniões do GIÉDISE - Grupo Informal de Estudos e Discussões Sobre Saúde Escolar, em São Paulo, do qual fui coordenador e da Associação Paulista de Saúde Escolar – APSE, do qual fui Vice-Presidente no biênio 1991/93. Participei, como um dos representantes da Prefeitura Municipal de São Paulo, de reuniões periódicas durante quase três anos do grupo coordenador do SIAME - Sistema Integrado do Atendimento Médico do Escolar do Estado de São Paulo, multiprofissional e multi-institucional. Em todas estas entidades procurava-se sempre incluir pessoas de diversas profissões e ocupações advindas do Estado, da Prefeitura, do ex-INPS e da USP, o que enriquecia os debates.

          O Professor  Paulo Freire, Secretário da Educação na gestão Erundina do Município de São Paulo, exerceu importante papel quando, sob sugestão da Dra. Ana Cecília Lins Sucupira, Diretora recém-empossada do Departamento de Saúde Escolar, baixou uma ordem de serviço suspendendo de vez por um ano os exames em questão. Em sua justificativa foi categórico em afirmar que nossas crianças da periferia faziam muito mais exercícios em suas corridas e brincadeiras de bola e capotões do que a ginástica na escola.  O recurso,  assim economizado com o pagamento dos médicos, foi remanejado para a merenda dos alunos. Na Prefeitura e depois na rede estadual que acompanhou a experiência da Capital, ganhei alguns inimigos entre estes colegas que faturavam um dinheirinho extra por produtividade e entre os professores de educação física que exigiam o atestado assinado pelo médico a fim de tirar sua responsabilidade caso alguma criança falecesse durante a aula de educação física. Erro grave constatado foi a dispensa da educação física em crianças com bronquite asmática. 
          Com nosso convite, Professor Luzimar deu várias aulas em reuniões regionais que fazíamos com diretores de escola, professores de educação física e inspetores escolares, tanto da Prefeitura, como do Estado, provando a importância da piscina na melhoria e eventual cura da asma. Sua tese de doutoramento foi nesta área. Sob a orientação do Professor Dr. Hélio Maciel, Diretor do Departamento de Saúde Escolar da PMSP e que antecedeu à Dra. Ana Cecília, assinou-se um convênio pelo qual tanto as crianças da Prefeitura como do Estado pudessem, em turnos, participar de aulas periódicas especificas de natação para asmáticos na Escola Municipal de Vila Mariana. Os professores de educação física interessados em serem lotados nesta escola receberam treinamento com Prof. Luzimar na Escola de Educação Física da USP na Cidade Universitária do Butantã. Casos mais graves, tanto das escolas estaduais como das municipais, eram encaminhados diretamente para as piscinas da USDP sob supervisão direta do Prof. Luzimar.
          Em 2002, ingressei na regional do Rio Grande do Sul (Presidente Dr. Luiz Alberto Fernandes Soares) da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores - Sobrames  e em 2003, na Sobrames paulista, por indicação do meu irmão Walter e mais recentemente, em 2012, na regional da Sobrames do Ceará. Em 2005, me afastei da Sobrames-SP na qualidade de separatista e dissidente, voluntariamente, devido a incompatibilidades administrativas e pessoais. Neste interregno, fundei no dia 5 de maio de 2005 o Movimento Médico Paulista do Cafezinho Literário - MMCL na sede da Associação Paulista de Medicina em São Paulo, durante as comemorações do quadragésimo aniversário da fundação da Sobrames em nível nacional. Participei, ao longo dos anos, de vários congressos e outros eventos na área de literatura e pediatria,  inclusive um em Buenos Aires, em 1977, de Saúde Escolar. Participei de diversas pesquisas com Dr. Soares, tendo sido por ele agraciado com os títulos de Assessor Literário-Cultural e Pesquisador Itinerante da Sobrames em nível nacional.

          Organizei três eventos do MMCL com uma equipe multiprofissional na Associação dos Médicos de Santos-SP e colaboração indispensável do seu Presidente e meu amigo pessoal o Ven. Dr. Arnaldo Duarte Lourenço (2008, 2009 e 2010) que tiveram como Presidentes de Honra, respectivamente, Dra. Gessilda Porto Alegre Falcão, R.I.P., (de Pelotas e Santos), Dr Rodolpho Civile (de São José dos Campos) e  Dra. Alitta Guimarães Costa Reis (de São Lourenço e São Gonçalo do Sapucaí-MG). Com esta ultima, publiquei três livros denominados "A presença literária do MMCL" que foram coletâneas englobando contos, crônicas, resenhas, comentários e programações dos congressos da entidade. Venho publicando artigos e comentários no blog da Sobrames-CE, em sua Antologia anual a partir de 2013 e há alguns anos atrás em outros blogs, enfocando resumos biográficos/históricos de vultos da importância de Dr Albert Schweitzer, Drs. Alexis Carrel e Henry Drysdale Dakin, Prof. Dr. Luiz Hildebrando Pereira da Silva, Prof. Dr. Cornélio Pedroso Rosenburg, Prof.Dr. Thomas Maack, Prof. Dr. Erney Plessmann e outros. Muitos dos trabalhos apresentados nestes eventos foram posteriormente publicados na "Antologia Internacional Roda Mundo" (Itu - SP: Ottoni Editora, vários anos)
          Em S. Gonçalo do Sapucaí-MG foi fundado o Movimento Literário Saberes e Sabores – MLSS, em moldes semelhantes ao do MMCL e da Sobrames. Fui aquinhoado com o título de "padrinho" do MLSS em dezembro de 2009. Havia sido agraciado, anteriormente, com a comenda da Academia Vicentina "Frei Gaspar da Madre de Deus" de S. Vicente-SP,  à qual também pertenço na qualidade de associado efetivo, em março de 2009, no grau de comendador.  Reza o certificado da outorga da comenda: "... em reconhecimento aos seus relevantes trabalhos dedicados à Literatura e à Cultura Nacional". 
          Foram-me outorgadas mais três comendas comemorativas por parte da Academia Maceioense de Letras ao longo dos anos. Nenhuma das quatro comendas foi comprada. Em 2006, fui integrado ao Quadro de "Sócios" Honorários da Academia e dois anos depois elevado à categoria de  Membro Correspondente com direito à cadeira número 94. Escolhi como patrono o meu amigo e colega Dr. José Afonso Tavares Filho (R.I.P.) de Osvaldo Cruz-SP, falecido em 2007.
          Até a presente data, publiquei três livros, dois na língua portuguesa e um em inglês. O livro (esgotado) "Era Uma Vez Um Menino Travesso"  (São Paulo; Legnar Editora, 2004) trata de aventuras, traquinagens e vivências disciplinares no lar e na escola além do  amadurecimento cultural ao ingressar na Faculdade de Medicina. Traz também um panegírico sobre meu grande e saudoso amigo Prof. Dr. José  Antonio Alves dos Santos (1909-1999) da Faculdade de Saúde Pública, filho ilustre de Pindamonhangaba-SP e fundador do Museu Emílio Ribas no antigo Desinfetório Municipal de São Paulo. O outro livro no vernáculo é o "Meu Manifesto" (Itu - SP: Ottoni Editora, 2009) em que relato os verdadeiros fatos que me levaram a, voluntariamente, sair, na qualidade de separatista e dissidente, da Sobrames-SP em 2005, com o objetivo precípuo de dirimir assertivas injustas veiculadas tangentes à minha pessoa por aquele ramal.  Esta publicação foi distribuída à grande maioria dos membros da Sobrames-SP antes da Jornada Nacional da Sobrames de São Paulo em setembro de 2009. 
          O livro em inglês Some Of The Stories From The Paraguayan Chaco As Told By Knub-Knock-See-Hay (Walter Harris) relata aventuras e dificuldades culturais de meu pai, conforme narrações feitas a seus filhos e netos, à medida que foram crescendo, referentes ao período de cinco anos, após a Primeira Guerra Mundial, na década de 1920, quando viveu entre os índios "lengua" na margem oriental do Rio Paraguay.  Um pequeno diário que nos deixou também serviu de suporte para muitos fatos, lugares e datas em suas andanças. De momento, está sendo gradativamente traduzido para o vernáculo.

          Além de literatura, em toda a vida de jovem adulto me interessei muito por música, sendo meus compositores favoritos Haendel, Mozart, Mendelsohn, Beethoven, Bach e Pagannini. Estudei violino com o spala da Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo, Prof. José Giammarusti, a partir dos dez anos de idade.  Meu pai ficava exasperado comigo e ouviu do Sr. José a seguinte máxima: "Sr. Walter, tenha paciência. Todos podem aprender. A culpa é sempre do professor que ainda não teria achado o jeito daquele aluno assimilar os novos conhecimentos."  Ouvi, anos mais tarde, a Profª. Dra. Ruth Sandoval Marcondes da Faculdade de Saúde Pública da USP, fazer a mesma colocação em outras palavras.  Quando interno no curso Colegial do Arquidiocesano, tive dois anos de aulas com o Professor Lealdo Tumiatti que me treinou com o método de Hans Sitt até a nona posição.  Foi, no entanto, somente aos 17-18 anos de idade com meu amadurecimento biológico que passei a tocar razoavelmente bem. Ao ingressar na Faculdade de Medicina, fui convidado a fazer parte da Orquestra Universitária de Concertos, sob a regência do Maestro  León Kaniefsky onde muito aprendi e me aperfeiçoei. Na minha pensão, perto da Faculdade, morava o maestro José Perdigão, poli-instrumentista, que nos domingos à tarde, ele ao piano e eu ao violino, apresentávamos, para os hóspedes da pensão e seus amigos, duetos muitas vezes acompanhados pela cantora lírica do Municipal Rosa Buchner. Sua voz ao entoar Casta Diva, Cuori Ingrato, Una Furtiva Làcrima, O Sole Mio e Torna a Sorriento arrancava lágrimas dos circunstantes. Durante quase três anos, Perdigão ao violoncelo, Prof. Hilário Veiga de Carvalho, Catedrático de Medicina Legal da FMUSP e Diretor do IML do HC à viola, Prof.Dr. Murillo Pacca Azevedo eminente virologista  do Instituto Adolfo Lutz e spala da Orquestra Universitária de Concertos e eu, como segundo violino, nos reuníamos num quarteto informal ora na casa de um, ora na casa de outro, semanalmente. Com o passar dos anos, por absoluta falta de tempo para manter a destreza manual necessária para tocar o Souvenir de Drdla ou a Campanella de Pagannini ou qualquer um dos concertos da era clássica, deixei de prosseguir nos meus estudos da música e tive de optar pelo exercício da profissão de médico sanitarista e planejador de saúde. Enquanto isto corria nos tempos de pensão e primeiros anos da Faculdade de Medicina, o Maestro Perdigão me incluiu entre os baixos dos corais da Igreja da Consolação dos Redentoristas em Pinheiros onde era organista e regente.  Saía da Igreja Anglicana às pressas, subia a Rua Aurora,  Major Quedinho e, correndo, carregando o paletó e gravata, chegava suado para não me atrasar no coral. Ele sabia do meu programa e até foi uma vez comigo conhecer nossa igreja por dentro. Ficou admirado de ver Mr. Fuller ao órgão e convidou meus pais para irem até nossa pensão num domingo à tarde. Como eu havia contado a Papai que Perdigão era capaz de tocar qualquer instrumento de sopro ou de cordas, ele levou um Tonette para testá-lo. O Perdigão nunca tinha visto aquela espécie de ocarina vertical de baquelite e em menos de três minutos tocou Humoreske de Dvörjak e Minueto de Bocherinni (a música predileta de minha mãe). Já escrevi em outro lugar que aqueles quatro anos na pensão de D. Tereza na Rua João Moura constam, em minha memória, como sendo alguns dos mais felizes de minha vida.
          Evitei participar de movimentos sócio-políticos durante minhas gestões nos cargos administrativos, não me envolvendo em casos pessoais de funcionários a mim confiados, procurando ir estritamente até os limites de minhas atribuições definidas em lei. Granjeei simpatia e respeito por minha irrestrita e ilibada honestidade e competência ao lidar com questões orçamentárias, tendo apresentado em diversos congressos e publicado diversos trabalhos de minha área.
          Aproximando-me aos oitenta anos de idade e portador de algumas entidades nosológicas que me dificultam a deambulação e vêm ocasionando sérios impedimentos globais crônicos de saúde, quase não mais saio de casa. Venho delegando a lideranças locais minhas funções de coordenação de tertúlias literárias periódicas em algumas das treze cidades onde foi implantado o MMCL. Nas reuniões até agora havidas, produziu-se perto de um milheiro e meio de trabalhos, boa parte dos quais, repetidamente, saboreio pela excelência de sua qualidade.
          Sou casado com Maria Lúcia Nogueira de Camargo Harris, Diretora aposentada de Escola Estadual de São Paulo, com quem tive quatro filhas e um filho que perdemos num acidente de motocicleta em 1983 aos dezessete anos de idade. O Dado sempre fez muita falta aos que o conheceram. Nossa biblioteca em casa o homenageia com uma placa metálica em sua porta.
          Já mencionei anteriormente nossa primogênita Ana Lúcia e nosso netinho Alexandre, que fará mês que vem 10 anos de idade.
 
          Maria Inês, a segunda filha, é química, com doutorado e pós-doutorado na UNICAMP em toxicologia celular e molecular de radicais livres, além de outro pós-doutorado no Centre National d' Études Nucleaires, em Grenoble, na França, na área de lesões de ácidos nucleicos. Leciona em várias faculdades por este Brasil afora e dá assessoria a várias empresas de grande porte na área de cosméticos. É mãe de nossas netas mais velhas: Carolina é advogada e trabalha no Rio Grande do Sul numa Procuradoria do Estado; a Sabrina é arquiteta-engenheira e está passando, presentemente, alguns anos dos Estados Unidos acompanhando seu marido Tiago que está fazendo pesquisas em Pittsburgh.  Já temos um netinho americano, o Leonardo que, atualmente, está perto de cinco meses. Virão ao Brasil em fins deste fevereiro próximo para passar trinta dias conosco. 
 
          A terceira filha é a Isabel, bióloga e paisagista, casada com o agrônomo economista rural Danilo há 25 anos. Estiveram já duas vezes nos Estados Unidos enquanto ele fazia suas pesquisas de pós-graduação na Universidade de Purdue em West Lafayette, no noroeste perto da região dos Grandes Lagos, no Estado de Indiana.  Numa segunda estadia lá ficaram em Davis, na Califórnia. Aperfeiçoaram seu inglês lá e a Isabel chegou a lecionar a língua em Viçosa e Sorocaba, onde se instalaram há cerca de dez anos e onde o Danilo vem coordenando a implantação do Campus Avançado da Universidade Federal de S. Carlos. Sua filha Marília está terminando o Curso de Veterinária em animais de grande porte em Lavras-MG.
 
          Nossa filha caçula Maria Cecília cursou Educação Física e leciona hidroginástica em dois dos melhores clubes de Campinas, o Clube Fonte São Paulo e a Hípica, há vinte e poucos anos. É casada com o Ubirajara, engenheiro químico formado na UNICAMP. São os pais da  Deborah que se forma este ano na Faculdade de Direito da  PUC de Campinas, na mesma escola onde seu tio-avô Dr. Jorge Nogueira Camargo (R.I.P.), desembargador, se formou em 1956 na primeira turma.
 
          Em minhas orações, sempre dou graças a Deus por esta maravilhosa família que Ele me deu e que nunca me causou desgosto algum.  São todos muito carinhosos e zelosos para com os pais, tios, sogros e avós.
  
AGRADECIMENTOS E CONCLUSÃO
 
          Termino, ou melhor, interrompo, por enquanto, este relato, desconfiando que já ultrapassei a barreira sugerida por um velho orador do Senado Romano: "ESTO BREVIS ET PLACEBIS". Agradeço a minha amiga Profª. Maria Lúcia Cunha Carneiro de São Lourenço-MG, pela paciência e exatidão com que fez as correções da língua portuguesa numa das primeiras versões deste texto há cerca de sete ou oito anos e da mesma forma, antecipadamente, manifesto minha gratidão às colegas Dras. Ana Margarida Rosenberg e Celina Côrte pelo que puderem fazer neste sentido nesta versão que ficou sendo cerca do triplo da anterior.
          Concluindo esta minha escrita, vou parafrasear um poema denominado "Cumplicidade" que encontrei no livro Devaneios, do meu amigo Prof. Dr. Murillo Tadeu de Campos da Academia Santista de Letras, chegado um pouco antes do Carnaval aqui em casa:
"O reflexo dos meus óculos/sobre o livro que leio/reflete minha cumplicidade/com o inda distante autor.//E, quando sou eu/o causador desse livro,/anseio que os meus leitores/sintam o meu coração/pulsando no que escrevi,/para que padeçamos juntos,/no mesmo forte e intenso ritmo."
 
 
WMH
Campinas, fevereiro de 2015.