Total de visualizações de página

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

POR: MARTINHO RODRIGUES - POR QUE, PAI?

Dr. Martinho Rodrigues - Médico e Membro da Sobrames-CE

POR QUE, Pai?

Por que permitis 
O desejo...
E a impossibilidade de
Satisfazê-lo?

Por que permitis
A distância
Insuperável que
Separa os homens?

Por que permitis
A ilusão
De que possamos
Existir
Além de um segundo?

Por que
Vos pergunto?
Porque eu, que nada sei,
Sinceramente não sei. 

domingo, 29 de dezembro de 2013

POR: HELDER MARTINS - CONTAR CLINICANDO

Contar Clinicando                             

Introdução
Dr. Aldino Muianga

Por: Aldino Muianga
Na generalidade o profissional de Saúde sempre acalentou o sonho de registar as suas experiências com os pacientes; porém, numa perspectiva que se situasse fora do território formal das unidades sanitárias. Aquelas experiências para-clínicas acumuladas seriam – e é assim que nós desejamos que elas sejam – o fio condutor da relação médico/paciente para o lado humano e social, porque cremos que, por detrás de cada história existe sempre outra história. E é nessas “outras histórias” onde muitas vezes achamos o bálsamo que no sub-consciente desanuvia os dramas do quotidiano, onde se desintrincam os novelos da psicologia dos pacientes e fazem-nos perceber quão complexa pode ser a natureza humana ou quanta grandeza se oculta numa palavra, ou ainda em gestos simples como aqueles que vão discorrer ao longo das narrativas nesta coluna.
Contar Clinicando constitui uma digressão ao “outro lado” dos enfermos, espaço onde ele ou ela se redescobre e reencontra, e onde o profissional de saúde reconquista a sua dimensão de ser social.
Assim sendo, vamos então contar clinicando.

------------------------------------------------------------------------------------

Contar Clinicando:
«Os bebés que dormem no ventre das mães…»                                                                                                                  
Dr. Helder Martins
                                                                                                                             Por: 
 Helder MARTINS


Publicado no informativo de dezembro/2013 da AMEAM (Associação dos Médicos Escritores e Artistas de Moçambique)

Esta publicação foi autorizada pelo autor, Prof. Helder Martins.


No longínquo ano de 1962, quando era ainda um jovem médico, fui trabalhar em Marrocos. Fui colocado no Hospital de Bou Izakarn, um Oásis no Sul de Marrocos, no Deserto do Saará, a 200Km da capital da Província de Agadir, que se situava junto da costa. Chegado a Agadir, pedi ao Médico Chefe Provincial para me autorizar a ficar no Hospital Provincial, algum tempo, para me familiarizar com o Sistema de Saúde marroquino e com os hábitos culturais da população. Era o meu primeiro contacto com um país, com o Islão como religião de Estado, o que condicionava muito a cultura das populações e as suas percepções sobre a Saúde e a Doença. O Médico Chefe Provincial concordou e acabei por ficar um mês.
Agadir era uma cidade que, 2 anos e meio antes, tinha sido devastada por um terrível terramoto. Só cerca de 25% da população sobreviveu. Quase todas as famílias tinham sido afectadas.
Aproveito fazer um parêntesis para contar uma estória verídica que ocorreu durante o terramoto. Este aconteceu pouco depois da meia-noite, duma noite de lua cheia. Um dos edifícios mais afectados, situado mesmo no epicentro do terramoto, foi um hotel de 12 andares situado perto da praia, que estava cheio. Ruiu completamente, como um castelo de cartas, e todos os ocupantes (em grande parte turistas) faleceram. Entre os hóspedes do hotel havia um jovem casal de franceses, recém-casados, que passavam a lua-de-mel. Estava uma noite quente e como já indiquei de lua cheia. Um pouco antes da meia-noite, a recém-casada achou que seria muito romântico e idílico ter relações sexuais na praia, dentro de água. O marido preferia o conforto da cama, mas ela insistiu no seu desejo e ele gentilmente acedeu. Foram os únicos sobreviventes do hotel. No meio do seu delírio sexual assistiram ao hotel a desmoronar-se. O noivo achou que daí em diante devia ceder a todos os caprichos da esposa. Não era caso para menos...!
Voltando à minha narrativa: Logo no primeiro dia, no Hospital de Agadir dou com uma médica portuguesa minha amiga dos tempos de Faculdade, muito embora ela estivesse uns anos à minha frente. Foi uma grande alegria. Ela era a Ginecologista do Hospital e foi com ela que comecei a trabalhar. Ela deu-me as primeiras orientações e foi uma ajuda extraordinária, para me fazer penetrar nos meandros daquela cultura e daquele modo de vida.
Antes de iniciar a consulta, a minha amiga explicou-me uma crença existente naquela população, de que, durante a gravidez, os fetos podiam «adormecer no ventre das mães e voltar a acordar mais tarde». As causas desse adormecimento e posterior acordar estavam em relação com acontecimentos mais ou menos felizes ou infelizes da vida do casal.
Uns meses mais tarde, comecei a ler o Corão e percebi donde vinha essa crença. Na realidade o Corão é um tratado de Direito. Maomé, o Profeta, ia fazendo justiça, à medida que os casos lhe eram apresentados e o Corão contém toda essa jurisprudência. Uma vez, confrontado com um caso complicado, de heranças de uma criança nascida muito tempo depois do alegado pai ter morrido, Maomé, para evitar confusões, declarou que a gravidez durava normalmente 9 meses, mas excepcionalmente, podia durar mais, até 5 anos. Daí esta crença dos «bebés que dormem nos ventres das mães». O certo é que essa crença resolve a vida de muita gente.
Quando a minha amiga começou a consulta, a primeira cliente era uma viúva, com uma gravidez de 4 meses, que dizia estar grávida do marido, falecido no terramoto, 2 anos e meio antes. Com o desgosto da morte do pai, o feto teria ficado a dormir e agora acordara de novo. Ela só não sabia porquê.

A minha amiga explicou-lhe que, ela podia dar aquela explicação a quem quisesse, mas nós médicos sabíamos que ela tinha tido relações sexuais, 4 meses atrás e, de certeza, não tinha sido com o defunto marido. Mas não serviu de nada. Ela continuou a jurar a pés juntos, que nunca tinha conhecido outro homem, senão o defunto marido. 
Durante a minha actividade clínica de um ano em Marrocos e mais tarde de 2 anos na Argélia, tive que fazer face a vários casos de «bebés que dormem no ventre das mães». Essa crença arranjava sempre a vida de alguém!

sábado, 28 de dezembro de 2013

POR: VICENTE ALENCAR - IMUTÁVEL



Vicente Alencar - Jornalista e Diretor de Cultura e Divulgação da Sobrames-CE

IMUTÁVEL


O tempo passou
mas o sol continua a brilhar
O luar é sempre belo
e a tua luz
é sempre a mesma.
Um grande amor
permanece em meu coração,
imutável,
plenamente sensivel
dedicado a você.

sábado, 21 de dezembro de 2013

POR: MARTINHO RODRIGUES - NO MEU JARDIM

Dr. Martinho Rodrigues - Médico e Membro da Sobrames-CE


 NO MEU JARDIM

A lua-cheia
ancorou no meu jardim.
Ela todos os meses faz assim,
só pra machucar meu coração.

Logo a mim,
que nem sei tocar violão...
Apenas canto, mas não canto ruim.

Cantei melhor, tempos atrás...
Tempos atrás, eu era melhor em tudo.
Talvez, não. Hoje sou melhor como pessoa.
O tempo desgasta o corpo, mas a alma aperfeiçoa.

POR: FÁTIMA AZEVEDO - QUANDO CHEGA DEZEMBRO

Dra. Fátima Azevedo - Médica e Membro da Sobrames-CE


QUANDO CHEGA DEZEMBRO... 
                                                                                     
            Quando chega dezembro,  chegam muitos pensamentos à minha mente e uma caravana de emoções ao meu coração. É como se um filme em rápida velocidade começasse a passar à minha frente. Mil perguntas começo a me fazer e percebo que poucas pessoas tem a real consciência do significado do Natal. Pessoas que não praticam a caridade durante o ano inteiro viram anjos-da-guarda dos pobres e desvalidos. Isso, enquanto tocam os sinos do Natal. Mas passada a meia-noite, quando a varinha de condão da bondade se quebra, essas pessoas voltam à sua normalidade e retornam à sua rabugisse e mesquinhez humana (ou desumana?).
            Quando chega dezembro, lembro de meus Natais de criança feliz. Sempre ao acordar, havia um presente do lado da cama esperando por mim. Lembro também que não tínhamos tanta fartura, mas tínhamos harmonia de sobra e as pessoas pareciam mais felizes e menos preocupadas com o sucesso financeiro, ou com a roupa de grife, ou com a última invenção tecnológica do mercado digital.
            Quando me chega dezembro, lembro dos idosos de minha família, rodeados dos mais jovens que lhes ouviam as histórias e as canções de então. Lembro de toda a família reunida e de muitas histórias engraçadas...
            Agora quando me chega o Natal, a alegria não é tanta... Vem a saudade dos que já se foram... Vem a preocupação com os que não tem um pão seco na mesa para comer, enquanto nas instituições públicas tanto dinheiro é gasto com comemorações cheias de comilança e pouquíssima consciência fraterna.
            Quando chega dezembro, já fico pensando em que desculpa darei para não ir a essas comemorações cheias de discursos e tantos comes-e-bebes que não levam a nada. Este ano não fui a uma sequer desse modelo. Fiquei feliz comigo mesma!
            Tantas palavras bonitas nas festividades do Natal e no dia seguinte não se perdoa uma pequena falha de um irmão, de um companheiro, de um motorista pouco educado no trânsito. Será que estamos todos ficando loucos?.... Estamos todos ficando mais falsos?....Mais ridículos...a cada ano que passa?
            Não aguento mais festividades de Natal onde a fraternidade não esteja presente, onde apenas pessoas muito queridas não estejam. Basta de tanta futilidade usando o nome de Jesus para exercer a vaidade. Chega! Estou fora!!
            Pra mim, quanto mais em casa e repensando o que fiz ou deixei de fazer, melhor o Natal. Mas, como faço parte de uma família que tem gente idosa e que ainda curte muito o espírito do Natal, rendo-me e participo da ceia. Mas, não nego, meu pensamento viaja o tempo inteiro! Contudo, não me culpo por isso. É minha forma saudável de sobreviver às festividades natalinas.

            Gente, acreditem, apesar de tudo que eu disse, eu gosto muito do Natal! Das luzes, das árvores de Natal, dos enfeites e da minha casa, que passa pelo menos uns dias, bem arrumadinha...

POR: VICENTE ALENCAR - LONGE

Antônio Vicente de Alencar - Jornalista e Diretor de Cultura e Divulgação da Sobrames-CE

LONGE

Vicente Alencar

Longe estás
e sinto muito pouco
onde agora estou.

Tua ausência
me embaraça
e me faz sofrer.

Não vejo sorrisos
a minha frente,
não vejo teu olhar,
não ouço tua voz.

Não posso tocar-te
nem beijar-te

Estou parado no tempo
a pensar em tí.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

POR: MARTINHO RODRIGUES - O PRINCIPE DOS CIRURGIÕES



Dr. Martinho Rodrigues - Médico e Membro da Sobrames-CE
                         
                            O PRÍNCIPE DOS CIRURGIÕES 



                           João é uma figura  carismática. Com  seu porte esbelto, caminhar a passos largos, seu sorriso quase infantil, sua simplicidade  e elegância no  trato com os pacientes, colegas e alunos, tornou-se  uma  unanimidade  que, contrariando  Nelson Rodrigues, não é burra. Diante das situações cirúrgicas mais  complexas, João encontrava  soluções simples e eficazes.Estilista do bisturi, no palco da cirurgia, ele era o  ator principal. Com suas mãos de pluma, olhos de águia, tinha o domínio completo de todo o campo cirúrgico. Seus dedos  ágeis executavam um gracioso balé, restaurando  feridas,  extirpando  tumores, semeando  esperanças   e, muitas vezes, fazendo milagres através de curas definitivas. Milagres  que,  não sendo fictícios, certamente  não valeriam para que propuséssemos  a  sua canonização.

                        João, na  realidade, era uma espécie de Ademir da Guiados cirurgiões. Como aquele grande e injustiçado craque palmeirense  que, com  largas  passadas, sempre com elegância e maestria,  parecia  lento em  campo ( fazendo lançamentos que deixavam  César ou Leivinha  na “cara do gol” ou  invadindo a área e  decidindo a  partida  no momento certo),  João também não tinha pressa.

                        Solicitado  para  resolver  os  casos cirúrgicos difíceis, o fazia com  tranquilidade enquanto discorria didaticamente,  para os seus auxiliares, a  história de cada técnica cirúrgica a  ser executada, quem a  havia imaginado, depois desenvolvido e  aperfeiçoado, com detalhes dos nomes  dos autores,  suas  origens, até  o  estádio atual –  uma conferência  magistral -  sem interromper o  nobre  artesanato  que  continuava  a  executar  com   suas mãos verdadeiramente “santas” como as de um mago do bisturi. 

            João decidiu parar, precocemente,  fazendo-o  com a dignidade e a calma que sempre o  caracterizaram.  Como homem sábio, não quis correr o risco de passar da hora. Guardou o  bisturi e  fez-se personagem viva  da  História da Medicina  como um  dos  mais  completos  cirurgiões  de  seu tempo, aliando ao grande  conhecimento  médico uma  invejável cultura geral: história da  Medicina, cinema,  música erudita, MPB, pintura, literatura, filosofia, teatro,  o que  tornava fascinante ouvi-lo  falar. A  exemplo  de Nilton Santos  no futebol,  João é a “Enciclopédia”  viva da Cirurgia. É  preciso  recolher  e perenizar no Museu  da  Imagem  e  do Som da Medicina ( que infelizmente não  existe) todo o  patrimônio histórico-cultural  que  é  a  sua Biografia, para que ele,  que  tanto contribuiu para  a  formação dos melhores cirurgiões contemporâneos, continue a  servir  de exemplo às futuras gerações de  abnegados profissionais da Medicina Cirúrgica.

          Faço tão  importante registro  por  sentir-me privilegiado em ter testemunhado o fazer hipocrático de uma geração de médicos  notáveis, que foram meus professores, como Paulo  Marcelo  Martins Rodrigues  ( o “Pai  da  Medicina Clínica” no Ceará), José  Murilo de Carvalho Martins ( entre  nós, o  “Criador da Hematologia”),  Antônio Lacerda  Machado (o  pioneiro dos transplantes), Fernando Antônio Mendes Façanha ( organizador da Traumato-Ortopedia do HGF)  e, como companheiros de trabalho no Hospital Geral de Fortaleza, José Iran de Carvalho Rabelo (padrão-ouro da Clínica Médica  contemporânea), Francisco Valter  Justa  Freitas  ( ícone   da  Oftalmologia cearense), Elias Geovani Boutala Salomão (que deu vida à Unidade de Terapia Intensiva do HGF), João Evangelista Bezerra - o Príncipe dos Cirurgiões – e com  eles ter vivido  os Anos Dourados de uma Medicina “romântica”, com menos tecnologia, menos desperdício e muito mais dignidade  e respeito aos pacientes  e aos médicos.


sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

POR: JOSÉ MARIA CHAVES - COFIAR, DESCO(N)FIANDO



Dr. José Maria Chaves - Médico e Ex-Presidente da Sobrames-CE



                                    Cofiar, desco(n)fiando

           

Acordo, quando o reflexo miccional me impõe, por volta das quatro horas. A minha bexiga urinária parece cronometrada. Sempre observa esse horário da madrugada, para impingir-me a obrigação de esvaziá-la. É, também nesse tempo, que inicio o meu dia, pois debalde seria esforço para novamente conciliar o sono. Já nem insisto mais. Trato logo de permanecer no banheiro, afim de complementar com as outras atividades matinais, traduzidas pelo banho frio (enxampuzando  a cabeça) e pela famigerada barba a fazer. Aliás, eu tenho discutido muito sobre o que é mais desagradável, se uma menstruação por mês, para a mulher, ou o aborrecido barbear diário para o homem. Às vezes, aposto na segunda opção, sobretudo para os hirsutos, que sempre precisam se escanhoar duas vezes no mesmo dia.

            Mas, vamos ao que interessa. Durante toda a minha vida de rapazola, caprichei na feitura de um bigode- estilo Clark Gable- com uma diminuta separação mediana, identificando, clara e separadamente, os dois “braços” do dito cujo. Costumeiramente me saía bastante trabalhoso, exigindo uma habilidade artesanal a toda prova, para que eu pudesse me sentir mais atraente. Com o tempo, o bigode ( com o tira aqui, tira ali) foi afinando, e, sempre mais crescente nas pontas, para as quais adquiri o hábito de cofiá-las. Tornou-se, até mesmo, uma mania; volta e meia, lá estava eu segurando e torcendo a ponta do bigodinho, ora do lado direito, ora do lado esquerdo. Felizmente, bem a tempo, comecei a desconfiar do modo senil de meu comportamento, e, se desconfiar era preciso, melhor seria sacrificá-lo. Uma madrugada, por volta das quatro e meia, ao som do rádio, no banheiro, sempre ligado em volume baixo, ouvindo Fascinação na voz de Galhardo, empunhei a gilete e... adeus bigode. Contemplei-me no espelho do lavatório, e, considerei meu semblante mais jovem. Senti- me... mais apreciável.

  José Maria Chaves