Diário de uma quarentena (13º dia)
Dia da mentira em tempo de coronavírus
Por Arruda Bastos
Acho que estou mesmo ficando bipolar. No dia de ontem, o mantra era Armagedom, mote tenebroso que remete à última batalha do final dos tempos. Acho até que, pelos comentários dos meus leitores, deixei muita gente preocupada. No dia de hoje, para compensar e provar que a quarentena está me deixando meio “tam tam”, vou tratar do dia da mentira.
Quando criança, recordo de mirabolantes mentiras sem pé nem cabeça que eram contadas e acreditadas por muitos incautos. Era comum, na época, pregarmos peças nos irmãos e amigos. A data não passava em branco e era levada a sério pelos pequenos. Atualmente, infelizmente, vejo mais adultos do que crianças mentindo, e o tempo todo.
Pinóquio é um dos personagens mais conhecidos da literatura infantil. A história fala de um boneco de madeira que ganha vida. Ela foi escrita em meados do século XIX, por Carlo Collodi, e traduzida para o mundo inteiro ganhando uma série de adaptações.
Na história infantil, cada vez que Pinóquio mentia, o seu nariz crescia. A finalidade do autor era alertar as crianças, pois esse impulso de mentir acomete especialmente os pequeninos entre os quatro e cinco anos de idade. Ao ler a narrativa, a criança percebe que a mentira tem perna curta e, mais cedo ou mais tarde, a verdade sempre aparece.
No humor brasileiro, encontramos um personagem de Chico Anísio que encarnava o mentiroso contumaz. Ele era o Pantaleão e aparecia nas cenas sempre sentado, conversando com um convidado, e contando lorota. Ao lado dele, sua fiel mulher de nome Terta. Pantaleão, depois de mentir, perguntava “é mentira, Terta?”, e ela respondia “verdade”.
No Ceará, de 1904 a 1920, na Praça do Ferreira, debaixo de um cajueiro, acontecia sempre uma tradicional festa popular intitulada “Festival de Mentiras”, realizada, é claro, no dia 1º de Abril. Da festa participavam intelectuais, artistas e até bebuns. Todo tipo de mentira era permitida, de preferência as mais provocantes à sociedade e ao poder constituído.
Tem um ditado que diz: A mentira tem perna curta, mas quem nunca contou uma historinha inventada quando criança que atire a primeira pedra. O problema acontece quando o camarada passa a desembestar uma mentira atrás da outra, fica viciado e não sabe mais parar.
Não tenho duvida que, em breve, o dia da mentira se transformará no da fakenews. E, embora meus escritos não tratem de política no Brasil, atualmente temos um alto mandatário que é hors concours. Não vou dizer quem é, mas para testar a aceitação das minhas crônicas da quarentena, peço que coloquem o nome dele nos comentários.
Como contribuição da minha querida filha Lilia, incorporo à minha crônica as seguintes observações: Outra possibilidade para o futuro é ser instituído o dia da verdade, que será um dia excepcional em que não veremos as famigeradas fakenews na quantidade que são dissipadas atualmente. Às vezes, tenho a impressão que “dia da mentira” tem sido todo dia, com tanta lorota que se compartilha sem a menor cerimônia.
Para terminar, nesse dia da mentira eu queria inventar uma para vocês, dizer que a pandemia acabou, mas, no momento, estou muito ocupado aqui em Dubai polindo uma das minhas Ferraris.
Amanhã eu volto com uma nova crônica.
Este foi o dia nº 13. #FiquemEmCasa
Arruda Bastos é médico, professor universitário e presidente da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores (SOBRAMES-CE).
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