Dr. Geraldo Bezerra - Médico e Membro da SOBRAMES-CE |
JUSTO PROTESTO DE UM BÊBADO
Jovem médico, trabalhando em Juazeiro
do Norte, fui solicitado pelo Dr. Napoleão, da cidade de Jardim, para dar três
dias de plantão em seu pequeno hospital, já que o mesmo tinha que se ausentar
para assistir, em Recife, à formatura de um filho.
Fui. Tudo bem, cidade pequena e pacata,
quase não tive trabalho, acostumado que era com os plantões movimentadíssimos
do Hospital São Lucas, de Juazeiro. Aproveitei mesmo foi para me divertir
ouvindo “causos” que me contava um auxiliar de enfermagem, muito conversador.
Contou-me de um baixinho que morava bem em frente ao hospital, dizendo que o
referido, um dia, tomou um pileque tão brabo que subiu a pequena ladeira, à
chegada de sua casa, literalmente engatinhando. Mas não bebeu por gosto, não
senhor! Bebeu foi por desgosto e contrariedade por causa da ingrata da esposa –
no seu pensar. Foi assim: vivia a tal esposa manifestando o desejo de possuir
um conjunto de poltronas e sofá em sua humilde sala. Calado, o pobre homem
decidiu surpreendê-la e, no fim do mês, planejou muito mal o destino do seu
minguado salário. Em vez da bodega ou do mercado, onde comprar mantimentos,
compareceu foi à mais sofisticada loja de Jardim e ali comprou, à vista, o mais
bonito conjunto de assentos que uma sala jardinense conheceria. Chegou ao seu
lar com a prenda, crente que iria abafar. Qual o quê? Tomou o mais agressivo
cagaço da sua vida, até então, cagaço este somente superado em desaforos e
descomposturas pelo segundo com que a mulher lhe saudou naquela mesma tarde.
Humilde, não respondeu aos insultos da esposa, até por conferir-lhe razão, em
face às suas ponderações de que haveriam de se sentar naquelas vistosas
poltronas para comer vento ou morrer de fome.
Voltou com a mercadoria na mesma
carroça em que a trouxera e foi tentar desmanchar o negócio. Conseguiu e,
então, com menos dinheiro investido, comprou um fogão a gás butano, outro
antigo sonho de sua companheira. Quando apresentou a nova prenda, recebeu da
sua predileta o festival de desaforos já referidos acima.
Mais uma vez, conseguiu devolução do
dinheiro, mediante a igual devolução da mercadoria adquirida.
Com seu capital recuperado e o seu brio
profundamente ofendido, humilhado que fora por aquela ingrata a quem só quisera
fazer um agrado, entrou no mais movimentado bar de Jardim e bebeu cana até
colocar sobre o balcão seu último tostão, para pagar a saideira.
Chegou engatinhando, cheio de cachaça e
de razão, bolsos vazios e coração aliviado.
Desta vez, a desaforada não deu uma
palavra, que valentia de esposa tem as horas.
Caro colega Geraldo, me divirto com a sua prosa.Muito boa de ser lida.Parece que estou vendo a cena."Valentia de esposa tem as horas" :)
ResponderExcluirAbraço fraterno
Fátima Azevêdo