Total de visualizações de página

quarta-feira, 26 de junho de 2013

POR: GERALDO BEZERRA - JUSTO PROTESTO DE UM BÊBADO



Dr. Geraldo Bezerra - Médico e Membro da SOBRAMES-CE


JUSTO PROTESTO DE UM BÊBADO


         Jovem médico, trabalhando em Juazeiro do Norte, fui solicitado pelo Dr. Napoleão, da cidade de Jardim, para dar três dias de plantão em seu pequeno hospital, já que o mesmo tinha que se ausentar para assistir, em Recife, à formatura de um filho.

         Fui. Tudo bem, cidade pequena e pacata, quase não tive trabalho, acostumado que era com os plantões movimentadíssimos do Hospital São Lucas, de Juazeiro. Aproveitei mesmo foi para me divertir ouvindo “causos” que me contava um auxiliar de enfermagem, muito conversador. Contou-me de um baixinho que morava bem em frente ao hospital, dizendo que o referido, um dia, tomou um pileque tão brabo que subiu a pequena ladeira, à chegada de sua casa, literalmente engatinhando. Mas não bebeu por gosto, não senhor! Bebeu foi por desgosto e contrariedade por causa da ingrata da esposa – no seu pensar. Foi assim: vivia a tal esposa manifestando o desejo de possuir um conjunto de poltronas e sofá em sua humilde sala. Calado, o pobre homem decidiu surpreendê-la e, no fim do mês, planejou muito mal o destino do seu minguado salário. Em vez da bodega ou do mercado, onde comprar mantimentos, compareceu foi à mais sofisticada loja de Jardim e ali comprou, à vista, o mais bonito conjunto de assentos que uma sala jardinense conheceria. Chegou ao seu lar com a prenda, crente que iria abafar. Qual o quê? Tomou o mais agressivo cagaço da sua vida, até então, cagaço este somente superado em desaforos e descomposturas pelo segundo com que a mulher lhe saudou naquela mesma tarde. Humilde, não respondeu aos insultos da esposa, até por conferir-lhe razão, em face às suas ponderações de que haveriam de se sentar naquelas vistosas poltronas para comer vento ou morrer de fome.

         Voltou com a mercadoria na mesma carroça em que a trouxera e foi tentar desmanchar o negócio. Conseguiu e, então, com menos dinheiro investido, comprou um fogão a gás butano, outro antigo sonho de sua companheira. Quando apresentou a nova prenda, recebeu da sua predileta o festival de desaforos já referidos acima.

         Mais uma vez, conseguiu devolução do dinheiro, mediante a igual devolução da mercadoria adquirida.

         Com seu capital recuperado e o seu brio profundamente ofendido, humilhado que fora por aquela ingrata a quem só quisera fazer um agrado, entrou no mais movimentado bar de Jardim e bebeu cana até colocar sobre o balcão seu último tostão, para pagar a saideira.

         Chegou engatinhando, cheio de cachaça e de razão, bolsos vazios e coração aliviado.

         Desta vez, a desaforada não deu uma palavra, que valentia de esposa tem as horas.

Um comentário:

  1. Caro colega Geraldo, me divirto com a sua prosa.Muito boa de ser lida.Parece que estou vendo a cena."Valentia de esposa tem as horas" :)

    Abraço fraterno
    Fátima Azevêdo

    ResponderExcluir