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terça-feira, 28 de abril de 2020

POR ARRUDA BASTOS: Diário de uma quarentena (40º dia)




Diário de uma quarentena (40º dia)
O bíblico, o profano e a Mulher de quarenta
Por Arruda Bastos

Hoje, 28 de abril de 2020, completo meus 40 dias de quarentena. O isolamento foi total desde o início e a única vez que saí foi por uma boa causa, afinal, pertencendo ao grupo de risco, tinha que tomar a vacina da gripe, como já relatei na crônica “Uma odisseia na terra dos vírus gigantes”.

A história das quarentenas nasceu no século 14. Na época, a peste bubônica matou mais de um terço da população da Europa. O governo de Veneza, temendo que o mal viesse do mar, determinou que todas as embarcações ficassem isoladas durante 40 dias antes do desembarque dos passageiros. O fato inspirou outras quarentenas em todo o mundo, agora baseadas em dados científicos que comprovam sua eficácia.

Como no dia de hoje escrevo a minha quadragésima crônica do “Diário de uma quarentena”, vou falar do número 40 e dos segredos e mistérios por trás dele. Para iniciar, encontrei que, em geral, esse número poderoso representa mudanças, transformações, desafios e decisões, mas também, tempo e paciência necessários para que todas as coisas se resolvam. Exemplo maior não poderíamos encontrar atualmente, na pandemia do coronavírus.

Nas Sagradas Escrituras, há uma frequente relação entre o número 40 e períodos de preparação e mudança: Deus fez chover 40 dias e 40 noites nos tempos de Noé (Gênesis 7,4); Moisés passou 40 dias de jejum no Monte Sinai, a sós com Deus (Êxodo 24,18); O povo de Israel passou 40 anos em êxodo pelo deserto rumo à Terra Prometida (Números 14,33).

Encontramos também que duraram 40 anos os reinados de Saul (Atos 13,21), Davi (II Samuel 5,4-5) e Salomão (I Reis 11,42), os três primeiros reis de Israel; Jesus foi levado por Maria e José ao templo 40 dias após seu nascimento (Lucas 2,22); Jesus jejuou durante 40 dias no deserto, onde foi tentado pelo demônio (Mateus 4,1–2; Marcos 1,12–13; Lucas 4,1–2).

Existem, ainda, diversas outras citações bíblicas com o número 40, mas vou preferir agora passar para o próximo assunto, o profano e lembrar-vos da música “Mulher de quarenta”, de autoria de Roberto Carlos, que foi lançada no ano de 1996. Na inspirada letra, encontramos que a mulher de 40: “Por experiência, sabe a diferença de amor e paixão, o que é verdadeiro, caso passageiro ou pura ilusão” e que, para o Rei, a idade não interessava: “Não quero saber da sua vida, sua história, nem do seu passado. Mulher de quarenta, eu só quero ser o seu namorado”.

Agora que me lembrei da letra, vou continuar cantando: “Se ela se distrai, uma lágrima cai, ao lembrar do passado, seu olhar distante vai, por um instante, a um tempo dourado. Retoca a maquiagem, cheia de coragem, essa mulher bonita que já não é menina, mas a todos fascina e a mim me conquista. Não quero saber da sua vida, sua história, nem do seu passado. Mulher de quarenta, eu só quero ser o seu namorado”.

Para concluir, digo que o número 40 é mesmo mágico, pois com ele foi possível misturar o bíblico e o profano. Com isso, espero que a crônica de hoje estimule o isolamento social, visto que sabemos, não como no século 14, que é a única forma de reduzirmos a disseminação de uma pandemia e o número de óbitos.

Amanhã eu volto com uma nova crônica.
Essa foi a do dia 40. #FiqueEmCasa

Arruda Bastos é médico, professor universitário e presidente da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores

segunda-feira, 27 de abril de 2020

POR ARRUDA BASTOS: Diário de uma quarentena (39º dia)

Diário de uma quarentena (39º dia)
Vou chamar a Feiticeira e Jeannie é um Gênio
Por Arruda Bastos

Nesta segunda-feira, 27 de abril de 2020, trigésimo nono dia de quarentena, fiquei realmente muito preocupado com as últimas notícias da pandemia no Ceará. O boletim da Secretária da Saúde do Estado, divulgado há pouco, demonstra um crescimento exponencial da covid-19.

Os canais de televisão, desde ontem e continuando nos telejornais de hoje, só demonstram números crescentes em todo Brasil, dificuldade de leitos, de atendimentos e ainda um grande percentual de pessoas sem noção que não atentaram ainda para o caos que estamos vivendo e continuam a burlar o isolamento social.

Como minhas crônicas buscam entreter as pessoas vou ficar por aqui, pois a verdade nua e crua da pandemia vou publicar como crônicas extras no meu livro “Diário de uma quarentena”. Elas serão apresentadas intercaladas com as de água com açúcar que posto todos os dias no site da SOBRAMES e nas redes sociais.

Pensando assim, depois de fazer uma verificação da audiência dos meus textos, descobri que os que tratam de coisas antigas, do arco da velha, são os preferidos. Resolvi, então, dar mais uma canja aos meus leitores da melhor idade e no dia de hoje vou tratar das séries de televisão exibidas nos anos 1960 e 1970.

Digo que nesse período eu era vidrado nas séries que normalmente passavam à tarde ou depois da novela das oito. Lembro da “A Feiticeira” (1964 - 1972), que contava a história de Samantha, que, além de uma dona de casa, era também uma bruxa capaz de fazer mágicas com uma torcidinha no nariz. Que bom seria se a Feiticeira existisse para afastar esse pesadelo de todos nós.

Outra que não esqueço é a “Agente 86” (1965 - 1970), uma divertida série sobre o espião Maxwell, que de um jeito atrapalhado e engraçado resolvia os crimes praticados pela organização criminosa CHAOS. Ele contava com a ajuda da bela agente 99. Seria muito útil se nos dias de hoje o atrapalhado espião encontrasse a vacina para o coronavírus em algum país do mundo.

Tenho saudade também da “Jeannie é um Gênio” (1965 - 1970), que narrava o acidente do major Nelson, piloto da Força Aérea Americana, em uma ilha deserta. Depois de cair, ele encontra uma garrafa com um gênio. O piloto liberta o cativo e descobre que o gênio é uma linda mulher. Os dois se apaixonam e ela vai com ele morar nos EUA. Que tal se encontrássemos um gênio nesse momento de quarentena para satisfazer nossos desejos?

De todas elas, “O Túnel do Tempo”, de 1966, que mostrava as viagens do cientista Doug Phillips e de outro que não lembro o nome, que como cobaias usam a máquina do tempo e acabam ficando perdidos, era a que eu não perdia. Suas viagens eram monitoradas pelos cientistas da sala de comando. Se a máquina existisse eu pularia sem sombra de dúvida o ano de 2020 como um toque de mágica.

Como já está ficando tarde, as duas últimas que lembro são “Perdidos no Espaço” (1965 - 1968) e “Viagem ao Fundo do Mar” (1964 - 1968). A primeira, uma série futurista que conta a saga da família Robinson no espaço a bordo da nave Júpiter 2. A missão foi sabotada pelo doutor Zachary Smith, um agente de um governo inimigo. A família então acaba perdida no espaço e não encontra a rota de volta à Terra. O Dr. Smith, com seu jargão “oh, dor!...oh, dor” e suas trapalhadas, caso estivesse aqui, ia tirar a quarentena de letra.

Já o seriado “Viagem ao Fundo do Mar” (1964 - 1968) conta a história do submarino Seaview e as aventuras de sua tripulação em missões, em cenários próximos da Guerra Fria. Os personagens Almirante Nelson e o Capitão Ted Crane eram os mais queridos. Às vezes nessa quarentena penso que estou isolado em um submarino tipo o Seaview no fundo do mar.

Para terminar, digo que estou me sentindo nessa pandemia como o jovem Will Robinson e o Robô B9 da série “Perdidos no Espaço” e o tripulante Kowalski em “Viagem ao Fundo do Mar”, sempre esperando encontrar um rumo e um final feliz.

Amanhã eu volto com uma nova crônica
Essa foi a do dia 39. #FiqueEmCasa

Arruda Bastos é médico, professor universitário e presidente da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores

POR ALCINET ROCHA: AURORA QUARENTENAL

AURORA QUARENTENAL

As sombras vão beirando com vagar
Noite alta que me gera comoção
O aconchego do silêncio a planar
O vento uivando em forma de canção
Convertem sutilmente sem cessar
Prata e breu na matizada amplidão

A noite-dia inicia o ardejar
No céu que irrompe rosa num rasgão
A paz logo meu corpo anestesia
E afrouxa o peso alçado ao coração

Refaço as trilhas do obsoleto dia
Anulo as árduas e a alvorada amplia
Meu olhar à vida com nova feição.

Alcinet Rocha é médica sanitarista e hematologista, primeira secretária da SOBRAMES/CE

domingo, 26 de abril de 2020

POR ARRUDA BASTOS:Diário de uma quarentena (38º dia)



Diário de uma quarentena (38º dia)
Domingo de precúndia e preguiça
Por Arruda Bastos

Nesse domingo, 26 de abril de 2020, acordei disposto como quase sempre durante os já trinta e oito dias de quarentena. Levantei cedo, assisti à missa do padre Marcelo, cumpri toda a agenda matinal: caminhar, levar sol, fazer alguma manutenção no apartamento, troquei até lâmpada queimada,  partir para um banho e depois para o almoço. Hoje, para variar um pouco, foi um filé com fritas que Marcilia pediu por delivery.

Em outras oportunidades, nunca tinha pensado na simplicidade do prato solicitado. Digo até que não fazia parte do meu cardápio preferido. O isolamento tem acarretado muitas mudanças na minha vida. O certo é que exagerei e comi mais do que o normal. Depois veio a consequência: aquela preguiça e até mesmo uma precúndia.

Depois de uma soneca, pois ninguém é de ferro, chegou a hora de escrever. Entretanto, o cérebro não funcionava e era um bocejar atrás do outro. Pensava em falar dos carecas, pois logo cedinho no instagram vi uma postagem do meu amigo Gabriel Seffair que dizia “visual pandemia, invejosos dirão que estou ficando careca”.  Desse tema vou tratar em outro dia, uma vez que vou necessitar de tempo para discorrer sobre o assunto, já que é dos carecas que elas gostam mais.

Fiquei a pensar no que escrever quando lembrei que, no dia de ontem, recebi uma carinhosa ligação solicitando permissão para publicar minha crônica “No tempo da brilhantina” em um livro escrito por idosos que também escrevem seu diário de uma quarentena. Fiquei sensibilizado com o pedido, visto que fui informado que os da melhor idade ficaram emocionados com as lembranças do tempo do ronca e as recordações do passado, da crônica.

Mas a preguiça e a precúndia não me estimulam a enveredar por essa linha. Preferi, então, para incentivar que mais leitores tenham acesso às minhas crônicas, fazer um release dos temas abordados durante a última semana. Muitas vezes, depois de escrever, fico pensando se realmente estou conseguindo o meu objetivo: entreter aqueles em isolamento e documentar o momento inédito que vivemos.

Decidi, assim, trilhar esse caminho e até mesmo por estar precisando recordar alguma das minhas crônicas, fui em frente. No domingo, iniciei com “O ‘gatoso’, a quarentena e o mesversário”; na segunda, o desabafo com o “É de lascar”; na terça, cheguei ao “Obnubilado de ‘A’ a ‘Z’”; na quarta, foi a vez da emoção com “O aniversário da netinha Larinha e o drible no coronavírus”; já na quinta, a nostalgia do “No tempo da brilhantina”; na sexta, o posicionamento com “ As lives das panelas” e no sábado aquele chororô com “ Os aniversários da Lilia e do Levi deixam o coronavírus doidim”.

Se meu leitor diário pensava que eu ia fazer um resumo de todas elas, digo que hoje não vai ser possível, pois a precúndia continua. O meu desejo é estimular quem não leu nas redes sociais a aproveitar agora para dar uma espiada no que escrevi. Se você está lendo no meu livro, já depois que tudo passou, e quando tudo agora é história, que tal voltar algumas páginas e reler algumas das crônicas que escrevi com as cordas do meu coração?

Concluindo, deixo o meu incentivo para todos e até para aqueles que, como eu, na tarde de hoje sentiram certa precúndia e muita preguiça. Vamos sacudir a poeira e continuar nossa cruzada de fé e orações na busca de força e conforto espiritual para enfrentarmos o que ainda há de vir nos próximos dias e semanas.

Amanhã eu volto com uma nova crônica.
Essa foi a do dia 38. #FiqueEmCasa

Arruda Bastos é médico, professor universitário e presidente da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores

sábado, 25 de abril de 2020

POR ARRUDA BASTOS: Diário de uma quarentena (37º dia)

Diário de uma quarentena (37º dia)
Os aniversários da Lilia e do Levi deixam o coronavírus doidim
Por Arruda Bastos
 
Hoje, 25 de abril de 2020, é o aniversário de duas pessoas muito especiais, da Lilia, milha filha caçula, e do meu netinho Levi. A comemoração em dose dupla foi o ponto principal desse sábado de isolamento social. Cada qual na sua casa, comemoramos às 17 horas os 06 anos do Levi e às 20 horas o aniversário da Lilia.
 
Como já comentei em crônicas anteriores, esse período da pandemia da Covid-19 não tem arrefecido o ânimo de muitas famílias em promover encontros virtuais para saudar a vida e agradecer a Deus a existência dos seus entes queridos. O amor tem vencido o coronavírus e as dificuldades desse momento.
 
A produção para as festas de hoje começou alguns dias atrás quando meu genro Raul, esposo da Lilia, e minha filha Lia, mãe do Levi, encaminharam solicitações de vídeos para apresentar aos aniversariantes no início do dia do aniversário. A produção ficou belíssima e emoldurou, conjuntamente com a chuva e os primeiros raios de sol, o inesquecível dia que nascia.
 
Levi é uma criança linda, inteligente, com muitas qualidades e de uma personalidade forte. No seu vídeo da abertura dos presentes, emocionou a todos com sua alegria infantil e os agradecimentos que fez de forma espontânea para os tios e avós. Digo que a minha vontade foi mesmo de sair de casa para dar aquele abraço bem apertado como ele gosta.
 
Lilia é uma filha exemplar, dedicada, de uma inteligência rara e uma beleza de dar inveja às misses do meu tempo de rapaz. É também meu braço direito nas minhas produções literárias. Seu vídeo demonstra a grande quantidade de amigos que com facilidade cativa com seu jeito brejeiro de ser. Deu-me vontade também de sair correndo para dar aquele beijo de aniversário.
 
As festas virtuais foram emocionantes e sem dúvida ficarão indelevelmente marcadas na nossa memória, somadas aos encontros realizados no aniversário do meu filho Bruno, do meu genro Evalto e da minha netinha Larinha, todos realizados nesse momento de isolamento. Não tenho medo de dizer que a fragilidade atual tem deixado nosso coração mais aberto a recepcionar o calor do amor.
 
Tenho certeza que o mais incomodado com tantas festinhas está sendo o coronavírus que, sem dúvida, é poderoso quando infecta uma célula do nosso organismo e, por isso, todo cuidado é pouco. Mas é frágil diante dos cuidados com a limpeza das mãos, o uso das máscaras, o isolamento social, a solidariedade e o amor incondicional.
 
Para os aniversariantes, desejo felicidades, paz, muitos anos de vida e saúde, que no período atual é o nosso maior presente. Digo que o amor sempre vence, não interessa as dificuldades. Parabéns aos dois e fica o meu desejo de que no ano de 2021 estejamos novamente juntos, agora fisicamente, para celebrarmos a vida e agradecermos a Deus e a Nossa Senhora a graça de ter passado por tudo com muita fé e orações.
 
Amanhã eu volto com uma nova crônica.
Essa foi a do dia 37. #FiqueEmCasa
 
Arruda Bastos é médico, professor universitário e presidente da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores.

sexta-feira, 24 de abril de 2020

POR ARRUDA BASTOS: Diário de uma quarentena (36º dia)

Diário de uma quarentena (36º dia)
As lives das panelas
Por Arruda Bastos

Hoje, 24 de abril de 2020, passamos o dia todo sendo bombardeados com as notícias da saída do Ministro Sérgio Moro do governo Bolsonaro. Foi pronunciamento pra cá e pra lá. Até agora, quando estou escrevendo minha crônica, as informações não param. O ministro saiu atirando e com certeza a situação do presidente vai se complicar muito. O pronunciamento de Moro mais pareceu uma delação premiada.

Como tenho compromisso de nas minhas crônicas não abordar temas políticos, a não ser de leve e quando o fato é muito relevante, se o som do tilintar das panelas, que batem insistentemente agora de forma ensurdecedora, deixarem eu vou voltar a escrever. Realmente está difícil, só mesmo com um fone de ouvido e fechando as janelas e portas vai ser possível continuar.

Nesse trigésimo sexto dia de quarentena e depois de tudo que relatei nos dois parágrafos anteriores, só mesmo apelando para a irreverência e o espírito moleque dos cearenses para tirar de letra. Assim sendo, resolvi escrever a respeito das inúmeras lives que inundam as redes sociais e de uma irreverente música que escutei no youtube.

Tenho participado de algumas lives, convidado que fui por diversos amigos como Jairo Castelo, Josemar Argolo do Jornal do Médico e muitos outros. Digo que foi uma excelente experiencia e a participação popular, o ponto alto. Foi tão estimulante que na próxima segunda-feira, dia 27, vou retomar o meu programa de televisão ”Encontro Marcado” com o parceiro José Maria Philomeno, agora na forma de live nas nossas contas do facebook.

Nos últimos dias tivemos ótimas lives: do Roberto Carlos, de Sandy e Junior, do Wesley Safadão, o festival “One World: Together At Home” e muitas outras. Todas bastante interessantes, com muita audiência e até com arrecadação de recursos para os mais necessitados.

Mas, no dia de hoje, de tanto ouvir batida de panelas, comentários nas redes sociais e na televisão, não me resta mais nada do que transcrever a letra da música, com bastante humor, “Não aguento mais “live” de Fábio Carmeirinho que transcrevo abaixo.

Eu agradeço a minha mulher / Por ter me preparado pra essa quarentena / Nesse confinamento / Todo hora ela manda eu fazer uma live / "laiva" louça, "laiva" a pia, vai "laivando" os pratos / Não tô aguentando fazer tanta live / "Live", vou fazer uma "live" / Não aguento mais "live" / Já "laivei" toda a louça / "Live", vou fazer outra live / Não aguento mais "live" / Já "laivei" toda roupa.

Para terminar, digo que tudo é brincadeira, pois estou aberto a novos convites para lives. Agora vou encerrar por aqui, pois, pelo que tudo indica, a barulhada de panelas vai ser tanta que não vai adiantar fone de ouvido, tampouco fechar portas e janelas.

Amanhã eu volto com uma nova crônica.
Essa foi a do dia 36. #FiqueEmCasa

Arruda Bastos é médico, professor universitário e presidente da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores

quinta-feira, 23 de abril de 2020

POR ARRUDA BASTOS: Diário de uma quarentena (35º dia)

Diário de uma quarentena (35º dia)
No tempo da brilhantina
Por Arruda Bastos

Ao acordar no dia de hoje, encontrei no pé da cama uma chinela havaiana. De imediato lembrei-me de uma propaganda que passava na televisão Semp Toshiba da casa do meu pai quando eu era criança. O reclame dizia que ela era a única alpargata que não tinha cheiro e nem soltava as tiras.

Recordo que, na época, eu usava mesmo era a genérica e ela tanto soltava as tiras quanto era meio fedorenta. As tiras, quando soltavam, eu dava um jeito colocando um grampo de cabelo de uma das minhas irmãs; o cheiro não tinha mesmo como resolver e, por mais que Atá, que também nos criou, usasse Seiva de Alfazema e passasse talco Cashmere Bouquet com a pluma da minha mãe, não tinha jeito.

No continuar do dia, quando passei a escrever, só me vinha à mente coisas antigas. O teclado do meu computador Dell se transformou em uma máquina de escrever Olivette lettera, o meu Iphone 8 Plus virou, de repente, um gravador K7 Gradiente que mamãe comprou na Lobrás da praça do Ferreira, ao lado do abrigo Central.

Com tanta nostalgia, pensei que estivesse ainda sonhando. Levantei e fui lavar o rosto. Chegando ao banheiro o caso piorou, pois a minha pasta colgate se transformou em uma gessy e encontrei também uma latinha de pomada minancora que usava para tratar as espinhas quando estava ficando adolescente.

Resolvi, então, trocar de roupa para fazer um pouco de exercício, na esperança de voltar ao normal. Entretanto, no closet só encontrei uma calça Lee Faroeste boca de sino e umas blusas de gola rolê. O tênis nike sumiu e no seu lugar descobri um velho "conga" e um Vucabrás 752. O pior é que acho que o mal passou para Marcilia, pois na parte dela do closet vi uma saia plissada xadrez azul e uma blusa de banlon amarela.

Pensando que era hipoglicemia, fui comer alguma coisa na cozinha. Lá chegando senti que o caso era mais grave do que eu pensava, pois encontrei no lugar da Brastemp uma geladeira Frigidaire contendo uma jarra de Q-Suco de morango, uma garrafa de Grapette, uma de Crush e outra de guaraná Taí.

Com tantos pensamentos desencontrados, fui à farmácia daqui de casa para me medicar. Chegando no armário onde guardamos alguns medicamentos, tamanha foi a minha surpresa quando encontrei um vidro de Emulsão de Scott, outro de Biotônico Fontoura e um tubinho de pílulas de vida do Dr. Ross. Ainda bem que não me deparei com óleo de rícino, pois seria capaz de vomitar.

Depois de toda essa provação, não tive coragem de descer. Não só com medo do coronavírus, mas também com receio de não encontrar o meu Compass e o Honda da Marcilia e sim no lugar a Vemaguet do tio Monteiro, o Gordine do Henrique ou o Jeep Willys 51 do Augusto.

Se você, meu leitor, conhece todos esses produtos, digo que está com uma excelente memória, mas, infelizmente, já pertence ao grupo de risco para Covid-19. É melhor ficar em casa e não facilitar, mesmo que um dia desse acorde perturbado como eu, hoje.

Para concluir e entrar de vez no clima, vou procurar uma edição da Revista Cruzeiro, ler um pouco da Seleções Do Reader's Digest e depois do banho usar Lancaster, a brilhantina Glostora, pomada Trim e o gel Gumex. Com toda essa belezura e com os poucos cabelos devidamente bezuntados, vou ajeitar a cabeleira usando meu pente Flamingo. Recordar é viver!

Amanhã eu volto com uma nova crônica.
Essa foi a do dia 35. #FiqueEmCasa

Arruda Bastos é médico, professor universitário e presidente da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores - SOBRAMES - CE.