Afastar-nos, para ficarmos juntos
Texto Publicado no Jornal do Médico, link abaixo.
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A cena que assistimos no dia 23 de janeiro de 2020, através de um vídeo de domínio público, postado no The New York Times daquela data, ganhou a mídia internacional e espalhou-se pelo mundo, deixando o povo em estado de espanto. As imagens apontavam para a existência de uma epidemia acontecendo na China, provocada por um coronavirus denominado de SARS-Cov-2 (Severe Acute Respiratory Syndrome - Coronavirus-2), cujo habitat seria o morcego, e que os animais contaminados através de tais mamíferos, se tornariam portadores e transmissores do vírus à humanos. Provavelmente foi isso que aconteceu num mercado da cidade de Wuhan, Província de Hubei, na Região central da China. Naquele janeiro, o SARS-Cov-2 exibiu seus primeiros estragos: infectara 400 pessoas e levara 17 à morte. No mesmo dia, noticiários nacionais e internacionais do mundo todo, anunciaram que aquela cidade era um movimentado ponto de ligação de viagens coletivas internas, por trem rápido, avião, barcos e, internacionais, por voos diretos, portanto, local de origem e disseminação provável daquela epidemia. Ainda naquele mesmo momento, autoridades chinesas da saúde anunciaram que a China estava vivendo “estágio crítico” de prevenção e controle de uma nova virose e, no dia seguinte, todos os transportes coletivos de Wuhan estavam interrompidos. O Vice-ministro da Comissão Nacional de Saúde da China disse: “Por favor, não vão para Wuhan e se estiverem naquela cidade, não saiam dela”. Fez isso com o objetivo de barrar a propagação da doença. A cidade ficou praticamente fechada: portos, transportes terrestres e aéreos; transporte coletivo gerais e internos, também. Aconselharam não se aglomerarem em reuniões. Fecharam-se as escolas, o comércio, cancelaram-se eventos. Estava assim decretado o distanciamento social, como medida de prevenção e controle da Epidemia que crescia em Whuan e já surgiam na Inglaterra, Estados Unidos e países vizinhos da China, como Coreia do Sul e Tailândia, tornando-se então, em poucos dias, uma pandemia. Consta que os infectados em outros países haviam estado em Wuhan dias antes. Estabelecidos os elos da contaminação a partir de Wuhan, tornou-se necessário interromper esse ciclo contagiante. No dia 24/01/2020, oficializou-se o LOCKDOWN (confinamento em português) em plena véspera das comemorações do Ano Novo Chinês, quando há o maior fluxo de migração interna do mundo. Rapidamente o sistema de Saúde da China imobilizou a leva populacional de migrantes que comemorariam aquele evento, no dia 25/01/2020 (BBC NEWS - Howard Lang). As pessoas foram tomando conhecimento desses acontecimentos em tempo real, no mundo inteiro. A experiência chinesa sobre lockdown foi transmitida em números e imagens nos noticiários de rádio e TV. “É o estado de globalização mundial que facilita a expansão das viroses no mundo ”, referiu Ana Margarida Rosemberg, em webinar do Jornal do Médico, no YouTube em 13/06/2020 e eu acrescentaria: é também essa globalização que facilita o encontro universal entre países, cujas ajudas mútuas poderão surtir melhores controles de endemias. A partir do primeiro momento de isolamento das pessoas em Wuhan e na China continental, houve uma crescente adoção de seus modelos controladores da doença, por outros países. Incluíam-se nessas medidas: testagem em massa, distanciamento social absoluto, que reduz a interação entre pessoas, rastreamento do foco da doença por aplicativos no celular; quarentena que aplicam-se àquelas pessoas originárias de locais onde há epidemia da virose. Na China e na Coréia do Sul, os modelos implantados levaram ao controle da COVID-19 em menos de três meses dos primeiros registros e foram tidos como eficientes pela Organização Mundial da Saúde (OMS) conforme disse Tedros Adhanom Ghebreyesus, seu diretor, exortando as nações do mundo a considerarem a experiência chinesa e coreana, em seus países. Cada País tomou sua própria iniciativa com relação ao confinamento e outras medidas de controle foram criadas. Sobre confinamento, há de se dizer que sempre esteve presente no controle das grandes pragas, pestes e endemias mundiais, desde Galeno de Pérgamo, médico e filósofo do primeiro século (129-199), cuja percepção o fez entender que lesões em uma pessoa, passam a outra e, portanto, recomendava o confinamento dos doentes, para não disseminarem suas doenças. Praticou confinamento também durante a grande peste da história, denominada de Antonina (165-180) (“O Olhar dos Mestres para o Agora”, de Margareth Dalcomo, O GLOBO de 09/06/2020). Mesmo com um lastro seguro das experiências antigas e atuais, nacionais e internacionais, para controle das endemias, o Brasil tem perdido o fio da meada das experiências exitosas, mergulhando desde o início da COVID-19, no obscurantismo do atual governo, quando seu mandatário debochou e debocha da gravidade que seria a disseminação da COVID-19 e rejeitou o isolamento social. Por isso, hoje somos o segundo país do mundo onde se morre mais da COVID-19. A razão disso é algo mais virulento e mortal do que o SARS-Cov-2: é seu próprio governo desgovernado, caótico, deletério e mortal. Foi aí que, para salvar vidas, praticando o confinamento de modo firme, uma colcha de retalhos se formou, com cada Estado cuidando de sua população, ao seu modo, a maioria seguindo e adaptando protocolos da OMS às suas realidades. Felizmente, no Ceará, desde janeiro de 2020, estabeleceu-se uma Força Tarefa que conduz de modo ininterrupto a aplicação das medidas de controle que vão desde o estabelecimento do Isolamento social ao Lockdown e à organização dos atendimentos hospitalares e de terapia intensiva, a fim de que os portadores da COVID-19 tivessem um atendimento humanizado e eficaz. Assim, tem se mantido o Sistema Único de Saúde, em pleno gozo de funcionamento: boa parte do Estado já mostra queda no número de infectados, hospitalizações e mortes. O Ceará afastou-nos de modo eficaz e, agora, paulatina e resilientemente, nos junta para uma nova maneira de viver sob o impacto da COVID-19.
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