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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

POR CELINA CÔRTE - VOZES

Dra. Celina Côrte - Médica e Presidente da SOBRAMES-CE


                                  VOZES
                                                                       
Enquanto alguns lutam, pesquisam e labutam
Para entender as vozes dos animais,
Cães, gatos, patos e,
Por que não, carrapatos?...
Tento, em vão, compreender as vozes dos racionais 
Dizem o que não pensam
Expressam o que não sentem
Falam sem pensar
E o que pensam, não dizem...

                                    Celina Côrte Pinheiro

POR MARTINHO RODRIGUES - AGOSTO, MADRUGADA

Dr. Martinho Rodrigues - Médico e membro da SOBRAMES-CE
                                    Agosto, madrugada.
                            (do livro Em Tempo de Poesia)
            
                      Em hora incerta (que muito insinua)
                      reaparece na minha janela,
                      me seduzindo a passear com ela 
                      entre os casais que ainda estão na rua.

                      Pouco importa se a madrugada é fria,
                      se minha voz me foge de repente,
                      se a poesia é uma mulher ausente
                      a debochar dos versos que eu faria.

                      Abro a porta, mesmo rouco e assustado,
                      sem resistir, jamais, aos seus encantos
                      ou recusar, nesses momentos, tantos
                      afagos brancos sobre o meu telhado...

                      Pois, sem pudor, logo que o sol é posto,
                      vem debruçar-se na minha janela,
                      depois, se erguendo, exuberante e bela,
                      cobre a cidade com o luar de agosto!...

                      Tendo a poesia a mendigar por ela,
                      mui democraticamente, entretanto,
                      casta donzela envolve com seu manto
                      palácios, e... casebres da favela.   
                                                                  Martinho Rodrigues          

domingo, 17 de fevereiro de 2013

POR JOSÉ WILSON DE SOUZA - MENTOR



Dr. José Wilson de Souza - Médico e Membro da SOBRAMES-CE

 MENTOR
 
          à Dra. Celina  Côrte Pinheiro
      Querida  presidente da Sobrames Ceará

Nos momentos difíceis,
luz que me norteia,
visão diáfana, doce espírito.
Liberto do corpo físico, da cadeia.
Emanas a caridade deste corpo etéreo.

Irmanados que somos no mesmo  mistério
luzes descem sobre nós, doce ventura.
Genuflexo cirineu, quedo na calma,
vivicando o nosso trabalho na cura
dos que sofrem do corpo e da alma

                                         José Wilson

sábado, 16 de fevereiro de 2013

POR JOSÉ WILSON DE SOUZA - O HOMEM E A ÁRVORE

Dr. José Wilson de Souza - Médico e Membro da SOBRAMES-CE



                                      O HOMEM E A ÁRVORE

Tenras carnes que o tempo curtiu
se transformando em árvore que floresce
com uma debalde esperança.

No outono suas folhas caem.
O   verão chega e o  calor das lágrimas
não  mais aquece nas noites de inverno

O lenho desprende suas cascas,
                           lâminas  de vida, numa inexorável marcha
                           para um final sem cruz.                                                                                           
                           O madeiro são cinzas de braços abertos  
                           de olhos sem  luz !       
         
                                                                        Jose Wilson de Souza

POR MARCELO GURGEL - A FISIOLOGIA DO PINHEIRO X A BIOQUÍMICA DO RAMOS


Dr. Marcelo Gurgel - Médico e Membro da SOBRAMES-CE

A FISIOLOGIA DO PINHEIRO X A BIOQUÍMICA DO RAMOS
Publicado In: SOBRAMES – CEARÁ. Ressonâncias literárias. Fortaleza: Expressão, 2009. 224p. p.166.


Por volta de 1955, no Instituto Evandro Chagas da Faculdade de Medicina, da recém-inaugurada UFC, o Prof. João Ramos estava ministrando uma aula da sua cadeira de Bioquímica aos acadêmicos do segundo ano, quando foi interrompido pelo seu dileto amigo Prof. Aloísio Pinheiro, o catedrático de Fisiologia, que, pondo a cabeça junto à porta, saudou-o:

– Bom dia, Prof. João Ramos.

– Muito bom dia, Prof. Aloísio – secundou o colega, sinalizando para que o outro entrasse.

O Prof. Aloísio Pinheiro atendeu ao convite e direcionou à turma um sonoro:

– Bom dia, caros alunos.

– Bom dia, professor – responderam, em uníssono, os discentes.

O Prof. Aloísio, que costumava provocar o mestre João Ramos em reuniões reservadas, no tocante aos seus respectivos setores de estudo, quis tornar pública a “rivalidade” de conteúdo, dizendo:

– Professor João Ramos quando é que o senhor vai se convencer de que a Bioquímica que você leciona não passa de um capítulo da Fisiologia?

A resposta não se fez por esperar, com aquele que se tornaria um intrépido bombardeador de nuvens e abnegado fazedor de chuvas, o Prof. João Ramos, que de pronto, retrucou:

– Sim, já me convenci, é um capítulo da Fisiologia – e arrematou – aliás, o único.

O alunado caiu na gargalhada, enquanto o Prof. Aloísio Pinheiro bateu em retirada. Depois disso, os docentes continuaram grandes amigos e a rixa científica entre eles desapareceu.

Marcelo Gurgel Carlos da Silva

POR JOSYANNE ARRUDA FRANCO - FESTA EM FAMÍLIA: NATAL É CONGRAÇAMENTO


Dra. Josyanne Rita de Arruda Franco - Médica Pediatra

Presidente da Sobrames-SP / Biênio 2011-2012

                      Festa em família: Natal é congraçamento

Publicado no Jornal O Bandeirante, ano XXI, no 241 - dezembro de 2012, Publicação Mensal da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores - Regional do Estado de São Paulo - SOBRAMES-SP 

Quando um ano termina, renovam-se as propostas: a vida acena sorrisos e possibilidades, planos são feitos, projetos são iniciados. Um ar de frescor bafeja os corações com promessas de felicidade, recomeços, acertos. Por todo lugar afloram gentilezas, tolerância e afetos. Como é bom acreditar em dias melhores e afortunados. Ao longo do período, os desafios aparecem, obstáculos se apresentam. É quando perseverança, determinação e firmeza de propósitos são testadas, mas não sem contar com boa dose de solidariedade, muito esforço conjunto e união permanente. Não é fácil ser quem somos: médicos escritores. Dedicação às letras requer tempo, gosto e compartilhamento como fonte e estímulo. Parecermos excêntricos simplesmente porque somos um pouco destoantes da média não é novidade; impressiona é nos reunirmos com periodicidade quase sagrada, publicarmos nossos trabalhos em coletâneas e antologias tendo, ainda, tempo para organizar jornadas e participar de congressos. Profissionais atarefados que abrem espaço na agenda para dedicar, com eloquência, preciosas horas na declamação de belos versos e leitura de excelente prosa. Pessoas que se interessam em promover arte e beleza, alimentando espírito e intelecto. O ano termina, realmente? Não, nunca, porque nada do que se vive pode estar finalizado: retorna nas lembranças, no sentimento cultivado, no lastro deixado com vigor, no tempo que se oferece e não se esgota com o passar dos dias. Nossa Sobrames-SP tem navegado nas profundezas do mar da literatura como um polvo que se desloca rapidamente no fundo do oceano. Seus braços tocam outras regionais em busca da proximidade que irmana e gera intimidade; a enorme cabeça conglomera ideias que pensam crescimento; o corpo frágil e muito sensível é flexível para se amoldar se for preciso, até mesmo se camuflar para às vezes não se deixar perceber, mostrando-se quando necessário. Visão acurada é requisito para não perder oportunidades. E é fundamental boa memória para armazenar fatos e história. A vida do escritor tem cores e nuances deslumbrantes: o que difere é a maneira de mostrá-las. Feito paisagem marinha rasa ou de profundidade, na Sobrames-SP buscamos luz para nossa alma, brilho às nossas palavras, cor para nossa existência e, quem sabe, retornando à superfície encontremos um lugar ao sol... O oceano de palavras onde emerge e mergulha nossa criatividade tem colossais representações: diversas espécies nadam em convivência necessária, nem sempre harmoniosa, pois a lei da vida é soberana e se faz inevitável lutar para sobreviver. São importantes o esforço que une e o movimento que congrega; entrejatos de tinta, cardumes e grandes predadores, as profundezas abrigam a diversidade que enriquece, a variedade que colore, a novidade exuberante de belos e surpreendentes corais. Nas regiões abissais dos grandes mares de letras, seguimos sem muito alarde: ainda somos uma sociedade literária de porte acanhado, apesar dos grandes e laureados nomes que enriquecem e dão prestígio ao nosso quadro de associados. Talvez a Sobrames-SP albergue muito mais do que pensamos,sendo um pouco de cada coisa e de cada um. Se lugar de passagem, de pouso, de voo ou aterrissagem, também é porto seguro, cais e ancoradouro. É mundo real e imaginário, onde há lugar para brincar e aprender, tolerar e apoiar: uma verdadeira sociedade de amigos. Em resumo, Sobrames-SP é família... E, sendo Natal, isso diz tudo!

                                          J osyanne Rita de Arruda Franco

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

POR RAYMUNDO SILVEIRA - CADÊ O MONTEIRO?


Dr. Raymundo Silveira - Médico e Membro da SOBRAMES-CE



Onde andará o Monteiro? Por favor, alguém aí em Portugal poderia me dar notícias dele? Gostaria imenso de reencontrar o Monteiro, pois não o vejo desde Agosto de 1980, portanto há exatos vinte e nove anos. Este início de conversa fiada está a se assemelhar com uma história real sucedida com um ricaço da minha aldeia, quando veio morar aqui na cidade grande. Ele se punha nas paragens dos autocarros e acenava para cada um que passava. Quando o veículo parava, ele subia, pedia ao condutor para aguardar um instante e indagava claro e em bom tom a todos os passageiros: “Alguém sabe dizer se o João Arruda vai aí?” Mas, quem sabe, até as pedras se encontram, diz um velho chavão. Pode ser que algum internauta lusitano conheça e dê notícias do Monteiro.

 Naquele tempo ele devia ter entre quarenta e quarenta e cinco anos, estatura mediana, cabeleira basta começando a grisalhar e a tez típica do homem mediterrâneo. Infelizmente, são apenas estes os detalhes que lembro a fim de descrever a sua aparência física, embora ainda tenha aqui comigo uma fotografia onde ele aparece. Só que do peito pra cima. O Monteiro foi o meu cicerone durante a minha primeira viagem a Portugal. Para ser mais preciso, foi o taxista que me levou a conhecer, não apenas a cidade de Lisboa, mas também o Estoril Cascais Queluz Sintra bem como toda a Estremadura.

“Vão à Europa?” Esta foi a primeira grande surpresa que tive durante a minha estréia portuguesa. “Ué, aqui não é a Europa?” “Quase!” Respondeu o Monteiro a sorrir. Somente algum tempo depois foi que fui me inteirar do porquê daquele quase. Mas isto é assunto que só caberia noutra crônica. Por enquanto, basta gravar estas três palavras: Pirineus, mouros e navegações. A segunda surpresa que o Monteiro me proporcionou foi quanto ao uso, ou melhor, ao não uso do gerúndio em Portugal. “Estão a gostar?” “Ficaram a conhecer bem o Castelo da Pena?” “Estão a ver as ruínas do Castelo dos Mouros?” Mais um tema para uma nova crônica. Por ora, é suficiente saber que fomos nós, brasileiros, que abusamos desta forma verbal, influenciados por idiomas adventícios.

Infelizmente, vou ter de fazer algumas restrições à competência do meu primeiro amigo em terras lusitanas, embora reconheça que estarei a ser um pouco injusto para com ele. É que as informações históricas que hoje eu detenho acerca da terra do Monteiro são, seguramente, dezenas de vezes mais ricas e precisas do que as dele próprio. Mas reconheço que seria exigir demais; algo assim como se alguém desembarcasse no aeroporto do Recife, tomasse um táxi qualquer e pedisse ao motorista que ministrasse uma aula sobre Maurício de Nassau e o domínio holandês no Brasil.

Então, o Monteiro não explicava – e nem haveria como – que no Mosteiro de Alcobaça estava situado o túmulo da desditosa Inês de Castro, ao lado dos restos mortais do seu amante apaixonado, Dom Pedro Primeiro (primeiro lá para eles, entenda-se, porque o nosso só nasceria 473 anos mais tarde); que o Mosteiro da Batalha foi mandado construir por Dom João Primeiro, marido da rainha Fillipa de Lancaster (e eu não teria hoje uma filha com este nome se, quando voltei ao Brasil, não tivesse ido estudar a história portuguesa); que naquele quarto do Palácio de Queluz - aí sim – nasceu e morreu o nosso Pedro I; que... São tantas as preciosidades que o Monteiro não contou, que tenho dó dos meus companheiros de viagem por não haverem reiterado, como eu reiterei, mais meia dúzia de vezes aquele mesmo roteiro.

Em compensação, nunca encontrei em Portugal, nem no Brasil, nem nas dezenas de países onde já estive, um gourmet igual a ele. Numa manhã de Domingo, ele nos levou mais uma vez para Cascais e fomos almoçar a um restaurante sobre cujas mesas repousavam braçadas de mariscos. Os crustáceos eram fresquinhos como flores recém-aparadas. Eu gosto mais de lagostas e de camarões frescos do que (ia dizendo de mim mesmo, mas reconheço que seria um pouco exagerado), do que... Tudo! Ao lado deles jaziam, sobre cada mesa, duas garrafas de Bucelas. Sentamo-nos a uma delas e eu fui ao vinho, às gambas e aos lavagantes como se estes fossem os únicos exemplares remanescentes na face da Terra.

Para ser exato, entornei, sozinho, duas garrafas de Bucelas e devorei boa parte dos camarões e dos lagostões. Já fiquei embriagado na Europa inúmeras vezes, mas naquele Domingo o Monteiro teve de cobrar taxa de entrega em domicílio, porque sem ele eu jamais teria chegado ao meu quarto no Hotel Flórida, à rua Duque de Palmela, 34. Noutra ocasião, ele nos levou a almoçar a Sintra numa espécie de taberna decorada à moda medieval. Foi uma festa para os olhos, mas sobretudo, para o paladar e para aquela minha devoção quase fanática ao deus Baco. Descemos por uma escadaria íngreme e, subitamente, deparamos com um ambiente parecido com aqueles descritos nos romances de Alexandre Dumas. As paredes eram revestidas com garrafas de vinho de todas as marcas cores safras idades rótulos buquês e sabores que se possa imaginar. O chão – entremeado de tonéis - era ladrilhado com imensos tijolos de barro cru. Tudo isso junto com o ambiente refrigerado transmitiam uma sensação de umidade que não havia. Pendiam do teto, como balões ornamentais nas nossas festas juninas, enormes pernis de porco defumado que lá atendem pela graça de presunto (presunto, lá, é fiambre). Enormes embutidos como linguiças, chouriços, salsichões e salames davam voltas pelo vão livre das paredes onde não havia garrafas de vinhos, e pareciam gigantescas serpentinas comestíveis; o cheiro fazia encher a boca de saliva até de quem estivesse sem apetite. Sair dali sóbrio e mal alimentado seria mais difícil do que encontrar homem menstruado.

Se eu não tivesse retornado mais a Portugal e alguém me pedisse informações sobre o país, só poderia responder com estas palavras: “aquilo não é país, é antes um gigantesco bebedouro e comedouro à beira mar plantado”. É o que devem estar a dizer os meus três companheiros de viagem que ainda não alcançaram a graça de voltar para lá. E tudo isso, graças ao Monteiro. Cadê ele, hein?

                                                      Raymundo Silveira[2]



[1] Capítulo do livro “LOUCA UMA OVA” – Prêmio Literário Para Autores Cearenses – 2010.



[2] Raymundo Silveira é médico e escritor. Durante onze anos foi membro do Conselho Editorial da Revista FEMINA, onde publicou artigos científicos. Tem também trabalhos publicados em outras revistas e livros médicos. Suas atividades na literatura convencional tiveram início com o advento da Internet. É membro da SOBRAMES (Sociedade Brasileira de Médicos Escritores). Em 2010 ganhou o Prêmio Literário Para Autores Cearenses, com o livro de contos e crônicas: “Louca Uma Ova”. Em 2011 recebeu o Prêmio Nacional de Conto e Poesia “Correio das Artes 60 Anos”, promovido pelo governo da Paraíba, com o livro de contos “Lagartas-de-Vidro”. Foi um dos contemplados com a Bolsa FUNARTE de Criação Literária – 2010, com o livro “Medicina Crônica”. Com esta obra venceu o “Concurso Literário de Fortaleza”, no ano de 2012.