Causo de
consultório – 3
O menino contava dez anos de idade e
sofria de atopia. Apresentava, na ocasião da consulta, inflamação e fissuras
profundas no sulco retroauricular de cada orelha. Enquanto examinava-o, a mãe
falava mal do Dr. Mesquita, meu amigo e com quem dividia o consultório na
Clínica Dr. Batista de Queiroz (na época eu atendia aos sábados em Quixadá). A
mãe falava, eu só escutava. Que o Dr. Mesquita não sabia de nada, que a pomada
que ele passou era o mesmo que água do pote. Eu só escutava e vasculhava o
cérebro à procura de uma boa tese para defender o nobre colega. Um médico
notável, sobretudo, humano e de excelente formação profissional: cirurgião
geral, clínico geral, obstetra e pediatra. E a mãe não parava de falar. Que em
Quixadá não tinha médico que prestasse, os doentes precisavam passar uma semana
esperando um otorrino para consulta e outros queixumes mais. Então, ocorreu-me o
assunto infalível para punir pelo colega, enquanto pensava as feridas do
menino.
- Mãe, a
senhora tem quantos filhos?
- Quatro. –
Respondeu a mãe, acrescentando que o pequeno paciente era o mais velho deles.
- Onde eles
nasceram?
- Na
maternidade do padre Luís.
- A senhora
lembra quem fez os partos?
- Claro! Foi
o Dr. Mesquita. Ele fez os quatro partos. O último foi cesáreo, a criança
estava sentada. – Informou a mãe, com a fala mais branda, como que desconfiada com
a falta de freio da própria língua.
Após esse diálogo a mãe permaneceu
calada, pensativa. Voltamos à anamnese.
- Mãe, qual
a pomada que o filho está usando?
- Esta aqui.
– E entregou-me o tubo da pomada vazio. Olhei-o, consultei a composição do
medicamento e comentei:
- Pois, graças
a esta pomada que o Dr. Mesquita passou as orelhas dele não caíram.
- Valha-me
Deus! – Exclamou a pobre mãe com visível expressão de aflição estampada na cara.
E continuou. – Eu falo assim do Dr. Mesquita só por falar, não é por maldade. Ele
é um santo! Ô doutor de mão boa! Abaixo de Deus, aqui em Quixadá, só o Dr.
Mesquita!
Claro que
logo depois tranquilizei a angustiada senhora, que os pavilhões auriculares do
filho jamais correram risco de cair.
- Por favor,
não conte nada pro Dr. Mesquita. Ele pode ficar zangado. - Suplicou-me a mãe, visivelmente preocupada.
- Fica nada!
Pode ficar sossegada. – Dei como resposta.
O melhor dessa história, à feição de um prêmio
que não poderia perder, foi uma sonora gargalhada do Dr. Mesquita quando lhe
contei o presente causo. Lá se vão 38 anos!
Sebastião
Diógenes.
Em 13-04-2014.
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