Dr. L. A. Fernandes Soares |
OS OLHOS VERDES DAS MENINAS DE GRAMADO
L. A. Fernandes Soares
Para quem nasceu e se criou na fronteira,
com as Repúblicas do Uruguai e da Argentina, onde vive uma raça de sulinos,
numa mistura de índio, castelhano e portenho, acostumado a ver apenas os olhos
castanhos escuros, genótipo típico e preponderante nas meninas daquele recanto
do Rio Grande do Sul, não há nenhum estranhamento.
Ao atingir-se o planalto serrano, sudeste
do Estado, pelo caldeamento de outras raças, oriundo do alemão e do italiano, observa-se
características genéticas completamente diferentes. Sente-se a forte predominância
do europeu. O mulato e o preto nunca passaram por essas terras. Talvez, agora,
pouco em pouco, eles venham a aparecer, porém, de imediato, sem influenciar na
degradação da raça padrão.
Aqui, sobre a serra gaúcha, é que passei a
ver, deslumbrado, novas características estampadas nas faces, principalmente
femininas. Então me deparei com os lindos olhos das meninas de Gramado. Para
encurtar a descrição e poupar comentários, diria que essas meninas carregam
duas pérolas verdes-turquesa no espaço onde deveriam estar as pupilas. São
fenótipos tão estranhos e diferentes que as palavras não conseguem interpretar.
Após ver alguns, passei a olhar no fundo de todos os olhos dessas meninas.
Fiquei encantado com a formosura e com a beleza...
Quando esses olhos encontram os meus,
tenho a impressão de que serei seduzido, anestesiado, paralisado, e ficarei petrificado
no tempo. São estruturas anatômicas indescritíveis, muito bem arquitetadas.
Há poucos dias, ao sair de um restaurante
em Gramado, dirigi-me a uma vitrine, atraído por um couro de boi rosilho,
curtido, e ali estavam duas belas meninas de uns cinco anos no máximo. Ao
vê-las, logo minha atenção foi despertada, ao deparar-me com dois pares de
olhos verdes que pareciam os campos verdejantes refletidos num espelho de águas
serenas e cristalinas. Não tive dúvida. Ao admirar uma delas, deixando a
vitrine de lado, não pude me calar e disse com certo alarde e um pouco de espanto:
- Mas que olhos bonitos! Parecem duas
pedras de safira estampadas em face tão linda! Você não quer me emprestar esse
olhar?
Nem bem acabei de falar e a garotinha,
para qual havia me dirigido, falou com muita naturalidade:
- Ora, tio! Pára!!! – e, em seguida, dirigiu-se à colega dizendo:
- Vamos embora!! Estou preocupada com o
assédio desse velho...
Bem que a
menina bonita de olhos verdes tinha razão! Tio e velho ainda... Restou-me o
direito de sorrir com naturalidade diante de tão pronta resposta. Nem por isso
parei de admirar esses olhos verdes, cor de safira lapidada. Continuei a
caminhar pela rua e olhava, encarava a todos que passavam, no desejo de
verificar se era um fato de valor estatístico alto.
Ao entrar na padaria, estava uma loira no
ofício de caixa. Corpo de miss, olhar provocante e atrás do balcão, dois
clones, muito bem copiados. Além de tudo, gêmeas!!
Eram três pares de olhos verdes,
brilhantes, que pareciam refletir a minha própria imagem. Ao chegar mais
próximo, notei que eram naturais e quase transparentes. Havia imaginado que
eram portadoras de lentes. O mais interessante é que as meninas-moças eram tão
acostumadas que os fregueses, por momentos, olhassem seus olhos, como se
estivessem olhando em espelho de cristal verde, que não baixavam e não
desviavam o olhar. Correspondiam e ainda abriam um largo sorriso, e se não fosse
o balcão, acredito que chegariam mais perto ainda.
Fiquei a contemplá-las, submisso àqueles
olhos verdes, que uma delas teve que bater com a mão sobre o balcão e
perguntou: - Ó tio, o que o senhor deseja?
Tive a impressão de voltar de um sono
profundo, quando despertei. Com muito tranquilidade e obcecado com a cena,
falei:
– Dez litros de leite e um pão... Aliás, apenas
um pão e um leite - corrigi-me um tanto confuso.
Fiquei a
recordar os caracteres genéticos. A fusão dos cromossomos. Para ser sincero,
não eram apenas os olhos que eram bonitos. Toda a anatomia era perfeita, talvez
tivessem no máximo 20 anos de existência. Eram meninas-moças capazes de ganhar
todos os concursos da fronteira.
Ao sair, já depois de pagar as despesas e
agradecer, quase na porta, tive a impressão de que ouvi uma voz sussurrante
dizendo: - O tio ficou encantado com os nossos olhos!
Também, pudera! Não foi só com os olhos...
Já na rua recordei os olhos verdes das meninas de Gramado e refleti,
silenciosamente: “É verdade!! Agora entendo que nasci muito cedo ou essas
meninas de olhos verdes de Gramado nasceram muito tarde...
Gramado, RS,
20/9/99