Para entender o bilhete,
devo confessar que sou leitor assíduo do poeta Pedro Henrique. Conheço-lhe bem
a arte literária, até as palavras que gosta de usar. Certa vez disse-lhe: “Como
o mestre gosta de ‘destarte’!...”. Respondeu-me sem detença: “Adoro, e a prima
‘dessarte’ também”. Desde então, quando nos encontramos na Academia Cearense de
Medicina, elencamos palavras agradáveis e aquelas desagradáveis aos nossos
ouvidos. Brincadeira de quem vive das palavras.
Prezado poeta,
Bom dia!
Conforme lhe falei durante
a caminhada na Praça das Flores, tive a honra de fazer a apresentação do livro
do Dr. Martinho. Não comentei, porém, sobre um fato inusitado. Quando
trabalhava no texto ocorreu-me um fenômeno que julguei sobrenatural. Na tarefa de
escrever, sempre o faço com o amigo Houaiss ao meu lado. É o meu protetor. Pois
bem, em determinado momento, quando iniciava um período com o conectivo “deste
modo”, eis que o Houaiss começou a tremer. Pensei tratar-se de terremoto. Logo
percebi que nada mais se mexia em sua volta, só o volumoso Houaiss tremia. De
repente, o dicionário se abre. E o que vejo? “Destarte” furiosa, alegando que
eu jamais a usara em meus textos. Falou mal da minha pena, e acusou-me de
ignorante, que não dominava a bela classe dos advérbios. Fez-se grande! Citou o
nome do nobre colega Pedro Henrique demonstrando intimidades, exaltando a sua
(dela) contribuição na qualidade literária do notável poeta. Dada à perplexidade de que fui tomado, fiquei
paralisado, e levei alguns segundos para reagir. Não houve jeito, rendi-me. O
estimado dicionário corria sérios riscos com os impropérios da insurrecta
palavra. Substituí a locução supracitada por “destarte”, pois, inconformada
estava com o meu desprezo. Roguei à revolucionária que ficasse calada, senão contaminaria
o Houaiss com palavras insubmissas, reivindicando soberania nos meus textos,
especialmente “outrossim”, vocábulo da mesma classe, e que não tolero. Afiançou-me, de letrinhas
juntas, fidelidade plena, desde que da sua prima “dessarte” não esquecesse. Não
resisti: capitulei! E o Houaiss quedo ficou!
Do seu admirador
Sebastião Diógenes.
29-08-2016
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