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sexta-feira, 2 de maio de 2014

POR: JOAO DE CAMPOS AGUIAR FILHO - DR. HERONDINO

Dr João de Campos Aguiar Filho
Médico Oftalmologista
Ex-docente de Anatomia do CCMB-PUCSP


Dr. Herondino

Texto enviado pelo Dr. William Moffitt Harris 

Se houve alguém que gostasse de etiqueta, bom comportamento social, que mantivesse a linha mesmo quando todos estivessem fora dela e outras referências conforme estão no poema “SE” de Rudiyard Kipling, esse foi o Dr. Herondino.
Ainda estudante, ao participar das patuscadas universitárias, mantinha-se dentro de limites aceitáveis.
Nada de dar “pinduras” nas datas festivas conhecidas, ou sequer fugir ao pagamento das marafonas, quando a masculinidade apelava aos sentimentos juvenis.
Na festa de formatura, enquanto os colegas lavavam a alma em homérica bebedeira, Herondino comemorou sobriamente com a família. 
 Começou a trabalhar no dia seguinte, ou quase, já que a formatura ocorreu num sábado, prolongando-se na madrugada do domingo. Bem preparado nos seis anos de Escola, estava pronto para a luta.
A princípio era “médico do corpo inteiro”, como afirmava ao explicar o exercício das funções. A pequena clientela obrigava-o a não recusar pacientes. Com poucos meses de trabalho já conseguiu selecionar, partindo para o tratamento de crianças.
Exercia a profissão em tempo parcial, dedicando horas no Hospital de Ensino, melhorando seus conhecimentos. Não era o tempo das “residências” atuais.
Andava sempre bem vestido, com camisa de mangas compridas, paletó e gravata, que não abdicou mesmo quando adotou o traje branco diário.
Não fumava e não bebia, sequer socialmente. Quando a necessidade de relaxamento apelava, recolhia-se e aliviava-se com alguns goles. Nada que pudesse comprometê-lo.
Fez carreira de sucesso crescente. Casou-se com a namorada dos tempos pré-universitários. Talvez tivesse cortejado outra mais, além daquela com quem “convolou” núpcias. Sim, Dr. Herondino não se “amarrou”. Contraiu núpcias , como exigia sua maneira de viver.
Foi muito comentado durante o desempenho da carreira pela dedicação, eficiência e pontualidade. No Hospital onde praticou medicina, auxiliares acertavam o relógio  pela manhã, quando ele adentrava rigorosamente no horário marcado. Fez historia.
Com o passar do tempo dedicou-se fielmente à especialidade para a qual foi adquirindo enorme conhecimento, quando seus clientes mudavam da faixa etária condizente, encaminhava-os para colegas.
Só permitiu-se uma exceção quando os dois clubes de futebol da cidade, com inimigos figadais de cada lado foram se duelar na partida que definiria o campeonato.
A disputa era tão acirrada que até os médicos assistentes dos dois clubes participavam da rivalidade.  A atenção aos traumatizados durante a disputa deveria ser feita por equipe rigorosamente neutra, evitando brigas no campo.  O único médico da cidade não simpatizante do esporte era o Dr. Herondino, que não conseguiu escapar ao apelo de todos os colegas, obrigando-o aceitar, pelo menos durante as horas da partida. O encargo dos primeiros socorros aos caídos no campo de luta.
Dr. Herondino adentrou o estádio impecavelmente de branco, incluindo  sapatos.  Se tivesse que atender o filho da Rainha da Inglaterra, não precisaria mudar o traje.
Assim, ouvindo palavrório do populacho, repleto de expressões vulgares e de calão, o médico cumpriu suas funções. Foi agraciado com placa comemorativa.
Mantendo essa linha de postura marcou época.
Quando houve desfile de beleza para as escolha da “Miss” que representaria a cidade no certame estadual, foi organizada festa no Clube Campestre, onde se instalou passarela e tudo mais que constitui o cenário para o evento, além das acomodações para os julgadores.
Dr. Herondino foi escolhido para ser jurado, devido ao notório bom gosto e observador da etiqueta.
Acomodado em lugar de honra, com os demais colegas juízes, assistiu as fases preliminares para a classificação das candidatas. Na hora da apresentação em trajes de banho, as mocinhas desfilaram com peças minúsculas, que mal dariam para confeccionar uma fralda, se destinadas para tal.
Dr. Herondino assistiu de perto, com olhar ao alcance de qualquer míope, a passagem daqueles estonteantes corpos juvenis perfeitos, sem alterar a fisionomia, sem dar qualquer “dica” de entusiasmo masculino.
Quando terminou o desfile, ele disse para os organizadores do certame:
 – Já as havia visto peladinhas.
Ante o espanto de todos foi preciso explicar que o reservado Dr. Herondino fora neo-natologista da maternidade local, onde elas nasceram e examinadas na primeira hora de vida.

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